//ANÁLISE// Aparelhamento da máquina pública

                                                                                        


Fernando Pesciotta


Diante da inação de Jair Bolsonaro na tragédia do covid-19 no Brasil, há alguns dias um amigo me sugeriu escrever sobre a inutilidade desse presidente. Em princípio achei a pauta interessante, mas refletindo melhor, conclui que Bolsonaro não é um inútil, ele trabalha arduamente para destruir muitas coisas e construir coisas ruins.

A Anvisa é um exemplo. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária foi criada em 1999, no governo Fernando Henrique Cardoso, para cuidar da segurança de produtos e serviços de saúde. Visa, ainda, fiscalizar a produção e a venda de medicamentos.

Oficialmente, ao longo desses 21 anos a agência vinha se mantendo independente e sob a gestão de especialistas do setor. Vinha, pois Bolsonaro destruiu esse perfil da Anvisa, que passou a ter diretores militares e “técnicos” alinhados ideologicamente com o presidente.

O diretor-presidente é Antônio Barra Torres, contra-almirante, amigo próximo da família Bolsonaro. Alex Machado Costa foi indicado por Bolsonaro por sugestão do Centrão. Alessandra Bastos é ligada à indústria farmacêutica. Meiruze Sousa Freitas era interina desde abril e foi efetivada em novembro.

Cristiane Rose Jourdan Gomes recorrentemente publica em seu perfil nas redes sociais artigos em defesa da cloroquina, que não tem comprovação científica no combate ao coronavírus. Foi indicada por Bolsonaro.

Jorge Luiz Cormann, tenente-coronel do Exército, ainda depende de sabatina do Senado para ser empossado na agência. Critica publicamente a CoronaVac e medidas adotadas pela OMS.

Bolsonaro aparelhou toda a máquina pública como ninguém nunca aparelhou. Usa o cargo em defesa da família, se apropria da estrutura de Estado para se promover, usa dinheiro público para sustentar terroristas que o apoiam. Na semana passada, a estatal TV Brasil transmitiu ao vivo, durante 10 longos minutos, Bolsonaro acenando para motoristas que passavam por uma rodovia no Rio Grande do Sul.

Nessas horas, lembro de Nuremberg. Ao final da Segunda Grande Guerra, a cidade abrigou o julgamento dos comandantes nazistas pelos crimes que cometeram. Hitler só não estava lá porque, covarde também, se matou horas antes de Berlim ser dominada pelo Exército Vermelho. Foi um momento de prazer do mundo todo ver aquela gente ser condenada à morte ou a longos períodos de prisão em Spandau.

De ricos para ricos

A pesquisa Datafolha feita por telefone mostra que Bolsonaro manteve estável seu nível de aprovação. Embora seja a pior para um primeiro mandato desde a redemocratização, Bolsonaro se segura pelo apoio do andar de cima. O maior apoio vem de ricos e empresários, o que ajuda a explicar o que é e o que pensa (?) a elite econômica brasileira.

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Fernando Pesciotta é jornalista e consultor em comunicação. Contato: fernandopaulopesciotta@gmail.com

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