//EDUCAÇÃO// Ensino à Distância dificulta inclusão escolar


Salete Silva

O sistema de ensino à distância (EAD) durante a quarentena tem dificultado o trabalho de tutoras de crianças com necessidades especiais da rede de ensino de Serra Negra e contribuído para aumentar a desigualdade entre elas e os demais alunos das escolas de ensino regular.  

“As crianças de educação especial foram simplesmente excluídas neste ensino EAD. Não se fez nada voltado para elas”, aponta a pedagoga Cristiane Crespo Inácio, tutora de um aluno de 12 anos portador de deficiência intelectual.

O EAD é um obstáculo ao processo de inclusão dos últimos anos, que tem evoluído de forma significativa. O número de alunos com necessidades especiais matriculados nas classes comuns da educação básica no Brasil saltou de 200 mil em 1998 para 1,18 milhão em 2018, segundo dados do Ministério da Educação.  Foram anos de conquistas e avanços.

Mas o sistema de ensino à distância, Cristiane avalia, só aumentou o abismo entre o aluno e a construção do conhecimento.

“Na minha experiência posso dizer que a maioria dessas crianças não consegue focar em uma tela e ficar ouvindo uma pessoa falar por 45 minutos sem interagir”, explica.

No chat (sistema que conecta pessoas num bate-papo por meio digital) a comunicação para as crianças de inclusão é ainda mais difícil. “Com muita gente falando, eles não conseguem fazer um feedback”, explica Cristiane.

Cristiane: EAD aumentou abismo 
entre aluno e construção do conhecimento

O principal desafio desse sistema, segundo ela, é enviar atividades que surtam efeito. “Meu aluno precisa de expressão corporal, do lúdico, da presença, do olho no olho", afirma.

A pedagoga conta com a colaboração da mãe, que neste caso, é muito presente e preocupada com a evolução e desenvolvimento do filho.

O aluno continua tendo assistência dos profissionais de apoio, como fonoaudiólogo e psicólogos entre outros. Além disso, ele conta com um plano de saúde para cobrir os gastos com essas terapias necessárias para seu bom desenvolvimento neurobiológico.

A família, ainda assim, sente uma sobrecarga nesse período de pandemia. “A mãe está trabalhando, a irmã mais velha não tem muita paciência, e o pai, apesar de presente, é separado da mãe e não participa do trabalho de aprendizagem”, explica.

O EAD também é dificultador para o aprendizado do aluno com necessidades especiais, na opinião da pedagoga Isabela Padula, tutora de um aluno de 11 anos, portador do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).

“Muitas crianças de inclusão não conseguem lidar com a tecnologia e o ensino realmente precisa ser presencial”, afirma.

Isabela: material tem 
de ser todo adaptado

Isabela adapta todo o material didático do aluno, porque ele não assiste às aulas por meio do aplicativo. “É muito confuso para ele”, explica.

O material adaptado é enviado à escola para que sejam feitas as impressões que são encaminhadas à mãe do aluno. “Faço também videoaulas explicando a matéria e envio direto no WhatsApp da mãe”, explica.

Adaptar todo o material é o maior desafio da tutora, que considera excessivo o conteúdo ministrado neste período. “Não acho produtivo sobrecarregar a criança com tantas atividades. É importante não parar e manter uma rotina de estudos, mas nada que seja exagerado e que a deixe ainda mais agitada”, observa.

Além da dificuldade de criar uma rotina diária de estudos, seu aluno continua tendo acompanhamento com a fonoaudióloga. A família fica sobrecarregada e com muitas dúvidas sobre como auxiliar a criança.

O sistema de EAD, ela avalia, expôs as dificuldades das crianças de inclusão. “As escolas deveriam dar mais espaço para essas crianças serem mais bem preparadas em todos os sentidos, de matérias à acessibilidade”, conclui Isabela.

 As mudanças ainda vão levar um tempo para acontecer concordam as tutoras, apesar do número crescente de crianças incluídas no ensino regular. “A inclusão no nosso país ainda está engatinhando. A gente vê essa falta de conhecimento desde os outros alunos até os próprios colegas de trabalho. Falta empatia”, avalia Cristiane. 

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