//JUSTIÇA// Crise aumenta procura por serviço gratuito

Cerca de 30 pessoas vão todas as semanas à OAB em busca de assistência judiciária gratuita

Salete Silva

As histórias de cidadãos serranos em busca de assistência judiciária gratuita revelam mais uma face da crise econômica e de seu impacto na vida de moradores e famílias da cidade.

O serviço oferecido à população de baixa renda por meio do convênio firmado entre a Defensoria Pública e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Serra Negra atrai cerca de 30 pessoas todas as terças-feiras, das 9 horas ao meio-dia, atendidas na sede da OAB.

A maioria dos casos tem relação com a família, como divórcio, dissolução de união estável, alimentos, guarda de menor, problemas com visitas e cumprimento de sentença referente à pensão alimentícia em atraso.

Muitos desses problemas foram agravados pela crise econômica, principalmente o atraso no pagamento de pensão alimentícia, avalia Luciano Cunha, presidente da Comissão de Assistência Judiciária da OAB/Serra Negra.

“Geralmente a mãe fica com a guarda da criança e o pai é quem paga a pensão, mas com o aumento das demissões muitos perderam o emprego e não têm como cumprir a sentença”, avalia.

A crise econômica teve forte impacto no município porque, na sua opinião, o setor turístico é o principal empregador em Serra Negra.

“A cidade é turística, temos engarrafadoras de água, mas não há uma indústria e o desemprego pesou”, diz.  Além disso, a dificuldade financeira, ele avalia, impacta nas relações familiares de forma geral.

No atendimento semanal, os advogados plantonistas da OAB fazem uma triagem para analisar individualmente os casos e analisar a situação financeira de quem pleiteia o serviço.

Em seguida, fornecem orientações ou indicam um advogado defensor para os casos, como o de Claudia Aparecida Onório Gonçalves, de 44 anos, que pleiteava na terça-feira, 1º de outubro, uma assistência jurídica gratuita para tentar reverter a ação de divórcio movida pelo marido.

“Não queria me separar, mas ele entrou com uma ação e eu não tenho recursos para contratar um advogado e, quem sabe, convencer o meu marido a desistir do divórcio”, afirmou.

Caso ainda mais dramático era o da dona de casa Vanessa Bueno, cujos filhos de 8, 10 e 12 anos foram retirados pelo Conselho Tutelar depois que ela se separou do marido, com quem foi casada por 15 anos.

“As crianças estavam comigo, mas há um mês fizeram contra mim uma denúncia de maus tratos e entregaram uma das crianças para o pai e outras duas para suas madrinhas. Mas quero meus filhos de volta porque a acusação é uma mentira”, afirmou.


Cunha: demissões trouxeram problemas
As pessoas que procuram pela assistência jurídica gratuita têm renda máxima de até três salários mínimos mensais, descontados os benefícios, assistenciais ou legais de aposentadoria e pensão, uma das exigências do convênio.

O outro requisito é possuir patrimônio no valor máximo de de 5 mil UFESPs (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo, utilizada para atualizar contratos e tributos estaduais), equivalentes a cerca de R$ 133 mil.

Cerca de 65 advogados, de um universo de 130 profissionais serranos, integram o convênio, atendendo nas áreas cível, criminal, júri, infância e juventude cível, infância e juventude infracional, além dos plantões em dias úteis.

Apesar do aumento da demanda, os advogados trabalham praticamente para cumprir uma função social. A remuneração do serviço fica muito abaixo do preço de mercado e em geral não cobre os custos do processo.

Um caso simples de divórcio consensual, por exemplo, pela tabela da OAB/SP é de no mínimo R$ 5.358,83. Pela tabela do convênio com a Defensoria do Estado de São Paulo é de R$ 617,42, apenas 11,52% do valor da tabela. Nesses valores ainda incidem impostos.


Daniel Coregio: remuneração baixa
“A remuneração é baixa, muito inferior a especificada na tabela da OAB/SP, mas nem por isso os advogados conveniados deixam de prestar serviço de qualidade”, diz o advogado participante do convênio Daniel Coregio.

Ele diz ter notado que colegas estão deixando de participar de algumas áreas do convênio em virtude do valor da remuneração, que, segundo o advogado, não cobre os custos operacionais. “Espero que a política de remuneração dos advogados conveniados pela Defensoria melhore”, conclui.

Ele salienta a importância desse serviço para a população mais pobre. “O advogado conveniado é a mão amiga dos hipossuficientes. É a voz das pessoas de parcos recursos perante os tribunais e fora dele por meio das orientações nos plantões”, afirma.

O presidente da Comissão de Assistência Judiciária admite que os valores pagos são baixos e que ficam aquém dos custos dos processos. “Não posso negar que a remuneração é baixa e existem pleitos para melhorar a remuneração”, diz.

A correção tem sido pela inflação, o que é insuficiente para elevar os valores a um nível maior. Segundo Cunha, a remuneração sempre ficou abaixo do mercado e ao longo do tempo foi se deteriorando ainda mais e reduzindo seu poder aquisitivo. 

Os advogados integrantes do convênio, diz, cumprem um papel social e em geral não dependem dele para a sobrevivência profissional. “É uma maneira de fazer a advocacia voltada para a Constituição, que é em benefício do cidadão menos provido de recursos financeiros.”

Ele lembra também que os recursos destinados à remuneração dos advogados vêm dos orçamentos públicos.” É dinheiro do contribuinte, então, temos de preservar a legalidade no uso desse recurso e também ter a responsabilidade”, afirma.

Ele diz que dificilmente os valores terão aumentos capazes de recuperar o poder aquisitivo para aproximá-los do valor de mercado. 

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