//OPINIÃO// Mais respeito com as mulheres

Salete Silva

Comecei a escrever este artigo na dúvida se deveria ou não revelar minha idade. Nunca escondi minha coleção de primaveras mesmo porque só se torna um colecionador delas quem consegue driblar os riscos diários de morte.

Mas para a mulher não basta estar viva. É preciso estar viva, feliz, bonita e principalmente com aparência jovem. Aos 50 anos tem de ter cara de 40 anos ou, quem sabe, 30 anos.

E se ela quiser frequentar universos dominados por homens, como a política, terá de enfrentar com indignação e coragem cenas de machismo explícito, como o observado na última sessão da Câmara Municipal de Serra Negra, segunda-feira, 17 de junho, à noite.

Em meio à discussão acalorada entre vereadores da situação e da oposição sobre os efeitos da economia estagnada no turismo serrano, um vereador soltou uma pérola que traduz o machismo em ebulição nessa era política bolsonarista:

“Sabe o que prefeitura de Serra Negra está parecendo?", interrogou o vereador. “A prefeitura de Serra Negra pensa que é 'que nem' (sic) aquela menina, desculpe o palavreado, que era linda, era musa do verão, lá nos anos 50, 60, parava a rua, e agora passados 40, 50 anos, está tudo (sic) enrugada, tudo caindo a gravidade. E a prefeitura acha ainda que ela é aquela garotinha dos anos 50, e não fez nem uma plástica.”

A ausência de mulheres no plenário não justificava a naturalidade com que a figura feminina foi usada para se referir a algo que era exuberante e que ficou caquético com o passar dos anos, mesmo porque o plenário é frequentado por duas ou três serranas que se sentam, todas as semanas, na primeira fila para acompanhar a sessão.

Elas merecem respeito, assim como todas as mulheres, incluindo as que não se interessam por política e as que acompanham a sessão pela internet, como eu. A indignação pode parecer coisa de feminista numa cidade que deu 81% dos seus votos nas últimas eleições ao candidato taxado de machista durante toda a campanha eleitoral.

Mas se indignação nesse caso é indício de feminismo, sou feminista e só devo ter amigas feministas porque nenhuma delas toleraria tal expressão.

A cena de machismo revela que os desafios das mulheres na política vão muito além dos números. Além de elevar a quantidade de mulheres eleitas nas urnas que no passado ficou pouco acima de 16% do total de políticos eleitos, elas precisam da coragem da deputada Maria do Rosário (PT-RS) que recebeu pedidos de desculpas por determinação judicial do presidente Jair Bolsonaro (PSL), condenado no processo por dizer que a deputada "não merecia ser estuprada".