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Conversei com uma jovem serrana de apenas 18 anos, que sonha ser musicista ou política. Seu maior sonho mesmo é cursar a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), uma das melhores no ranking das instituições de ensino universitário do país. Faltam, no entanto, tempo e dinheiro para realizar o sonho.
A garota, moradora num bairro distante do Centro, acorda cedo todos os dias, entra às 8 horas na loja onde trabalha como balconista e só sai às 18 horas. E é assim praticamente a semana toda, de segunda a segunda, com exceção de uma folga na semana e um domingo por mês.
Dos 40 alunos da sua turma do terceiro ano do Ensino Médio de uma das escolas públicas de Serra Negra, apenas duas colegas conseguiram uma vaga numa universidade particular. Uma delas numa faculdade online. Não tem tempo nem dinheiro para sonhar mais alto.
A maioria dos colegas da classe ou dá duro em um emprego como o dela ou ainda está em situação pior: trabalha na rede hoteleira até às 22 horas, não trabalha, desistiu de estudar e tem até quem está morando nas ruas. “Faltam oportunidades e esperança”, relata.
Mãe de um garoto da mesma idade que essa turma, não consigo esconder a comoção. Na programação do Festival de Inverno ou no Carnaval, a garota relata que não há espaço para esses jovens por aqui. Aliás, não há também lazer na cidade para esse pessoal o ano todo. “Quando a gente sai, dá um rolê e acaba voltando para casa. Não tem nada para fazer.” As oficinas de arte e esporte oferecidas pela prefeitura, ela avalia, não suprem essa lacuna.
Para ela isso explica o aumento de pontos de drogas e tráfico na cidade. Um dos novos pontos, ela relata, fica próximo ao Teleférico. Aliás, aquela área já foi um ponto de lazer dessa galera, em especial a pista de skate na Praça Sesquicentenário, que está sem manutenção e condições de uso.
“Reclamamos da pista de skate, mas não fizeram nada”, afirma. Ela soube que os vereadores comentaram sobre o assunto na Câmara Municipal depois que um amigo machucou o braço no local, mas nenhuma providência foi tomada.
“Ali já foi um lugar legal para a gente se encontrar, tinha campeonatos e vários eventos”, recorda. Os bares das ruas centrais, em especial os da Praça João Zelante e imediações, são inacessíveis. “A única vez que estive num deles, foi porque o professor pagou a minha conta”, afirma.
Na programação de covers do Festival de Inverno promovido pela Secretaria Municipal de Turismo e Desenvolvimento Econômico deste ano faltou o da Legião Urbana, o único que ela diz apreciar. “Melhor ir para Amparo, tem show de gente famosa”, explicou. Ela só conhece uma ou duas músicas da cantora Vanessa da Mata, que se apresentará no dia 27, mas acha que vale a pena ir ao show.
“A gente não conhece, mas sabe que é famoso e quer conhecer”, explica. Foi assim com o show de Michel Teló. “A maioria não gosta dele, mas foi no show porque é famoso e a gente quer ver de perto”, acrescenta. A cidade, ela sugere, poderia ter festival de bandas locais, dança e até feira de livro. "Comecei a gostar de ler mesmo há uns três anos", revela.
A garota reconhece que sua situação é ainda melhor do que a da maioria dos colegas da mesma idade e faixa de renda. "Tem gente no bairro das Palmeiras em situação ainda pior", diz.
Ela mora com mãe e tia em casa própria. Apesar de dividir as despesas da casa, comemora por ter convênio médico, benefício da empresa em que a mãe trabalha, em Amparo. “Não uso o hospital, vou ao PA da Unimed em Amparo, mas sei que aqui é ruim. Estive visitando uma amiga doente”, explica.
A cidade não é boa para os jovens na sua opinião e das colegas de trabalho, da mesma faixa etária e social, que também sonham com o ensino superior. “Uma quer ser psicóloga, a outra preparadora física e para isso precisa fazer educação física”, relata.
O transporte gratuito oferecido pela prefeitura aos estudantes de faculdades e cursos técnicos em cidades vizinhas é um benefício que os jovens de sua faixa de renda não têm acesso. “Não adianta, mesmo que tivesse o dinheiro para a faculdade, não poderia usar esse benefício porque saio às 18 horas da loja e não dá tempo de pegar o ônibus”, explica.
A garota comentou a reportagem do Viva! Serra Negra sobre o Índice de Progresso Social, o IPS Brasil, referente a 2024 que revela que Serra Negra é a segunda pior cidade para viver da região. Ela concorda com a informação. “Minhas amigas viram na internet e vieram comentar comigo porque é o que pensamos.” A notícia tem muito fundamento e revela uma realidade da cidade que só conhece e admite quem tem um olhar para essa parcela invisível da população.
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Salete Silva é jornalista profissional diplomada (ex-Estadão e Gazeta Mercantil) e editora do Viva! Serra Negra
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Comentários
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O transporte gratuito oferecido aos estudantes pela prefeitura será que não beneficia somente uma classe que tem poder aquisitivo para pagar uma faculdade particular?
ResponderExcluirQuem paga a mensalidade não pode pagar um transporte?
Será que não tem filho de gente rica que se beneficiando desse auxílio.
Será que todos que recebem esse auxílio realmente não poderia pagar além da faculdade também o transporte?
Dar benefício deveria ser somente para quem realmente precisa.
Prefeitura seria um tipo Robin Hood ao contrário? Tira dinheiro do cofre público para auxiliar os mais favorecidos?
Certamente deve ter alunos que realmente precisam deste auxílio, mas será que todos precisam?
Concordo plenamente sempre falei isso e peço para esses jovens pensarem bem em quem vão votar vão pois precisamos ter oposição na câmera os vereadores que estão lá na sua maioria são apoiadores do prefeito que agora se filiou ao PL
ResponderExcluirBelíssimo relato dessa jovem! Precisamos mudar, agora! Ou o que será da próxima geração? Sempre o mesmo do mesmo??
ResponderExcluirFestival de inverno, festival disso, daquilo, Carnaval. As bandas saonsempre bandas covers de bandas antigas. Pq não aparece uma cover da Adele, ppr exemplo? E o Carnaval, que só dá marchinha?
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