//MARCELO DE SOUZA// Prefeito fez as pazes com São Pedro



Na sessão da Câmara Municipal de ontem, dia 13 de fevereiro de 2023, depois de algumas reações enfurecidas de um ou outro vereador contra jornalistas que acompanham mais de perto a política serrana, não posso deixar de apontar uma fala que deveria ser no mínimo reavaliada pelos pares, pois pode eventualmente tratar de uma desinformação.

No final da sessão o vereador Eduardo Barbosa afirmou que neste ano não ocorreram problemas com enchentes na cidade devido ao trabalho da Prefeitura na prevenção.

É verdade que ainda não ocorreram problemas de enchentes na cidade este ano e é claro que os serviços de limpeza e manutenção das drenagens urbanas e o “lago seco” construído a jusante do novo loteamento minimizam o risco de problemas de enchentes no centro da cidade.

Mas tenho a impressão de que é falso que os problemas de enchentes não aconteceram este ano só por causa da prevenção colocada em prática pela prefeitura.

Penso que, ao contrário do que falou o vereador, existe uma componente de sorte, sim.

Vamos às explicações pessoais de um munícipe que não pode usar a tribuna da Câmara Municipal, mas pode usar este espaço que é aberto a todos, inclusive a todos os vereadores, secretários, prefeito etc.

A verdade é que ainda não caiu uma chuva intensa neste verão.

Sim, neste verão tem chovido quase que diariamente desde dezembro, mas é necessário observar que há pelo menos dois tipos de chuva: a intensa e a prolongada.

O primeiro tipo, as intensas, são aquelas que num pequeno intervalo de tempo o volume precipitado é elevado. Como por exemplo, podemos citar a chuva de 49,3 mm em 40 minutos ocorrida em 18/01/2022 ou a chuva de 02/01/2020, que precipitou 92 milímetros em 32 minutos.

O segundo tipo são aquelas chuvas prolongadas que, apesar do volume acumulado de chuva ser elevado, caem durante um período longo de tempo.

Este verão, até o momento, São Pedro tem sido amigável com Serra Negra e tem mandado muita chuva, mas não à vista e sim, em pequenas prestações diárias e ainda nos dá uns dias de sol para lavarmos e secarmos a roupa.

As precipitações máximas diárias observadas neste verão não têm ultrapassado algo em torno de 30 mm.

Infelizmente a Prefeitura não disponibiliza dados pluviométricos e dados fluviométricos. Tenho aqui um pluviômetro caseiro e acompanho também as medidas pluviométricas da estação meteorológica automática de Serra Negra disponibilizadas em www.viiagro.org.br .

Até este momento, neste verão, não desabou, ainda, nenhuma chuva intensa, na porção alta da bacia do Ribeirão Serra Negra.

As chuvas intensas aumentam o risco de enchentes. Essas são as que provocam as enchentes, principalmente quando a ocupação é densa, a taxa de permeabilidade é baixa e o sistema de drenagem urbana é deficiente.

As chuvas prolongadas aumentam o risco de instabilidade de taludes e encostas (deslizamentos) já que vão encharcando gradativamente o solo, um pouquinho por dia, até o dia que uma garoa é capaz de instabilizar uma massa de solo e provocar um deslizamento.

Os serviços de limpeza e manutenção das drenagens da cidade são uma obrigação de qualquer prefeitura. O morador espera que esse serviço continue sendo executado todos os anos pelo menos imediatamente antes do início do período de chuvas intensas.

A limpeza e a manutenção das drenagens é uma obrigação das prefeituras. Pagamos muito caro por isso. Serra Negra é uma cidade muito cara e a Câmara Municipal custa muito aos contribuintes. O IPTU aqui é um dos mais caros do Circuito das Águas.

Quanto ao reservatório de retenção temporário de águas pluviais instalado a jusante do novo loteamento, podemos discutir vários aspectos:

1. Esse é um reservatório de retenção localizado em uma única sub-bacia hidrográfica. Existem diversas outras sub-bacias hidrográficas afluentes do Ribeirão Serra Negra;

2. Esse reservatório parece ter sido construído para minimizar o aumento da vazão provocada pelo novo loteamento. Será que este dispositivo não deveria ter sido pago pelo loteador como contrapartida ao impacto gerado pelo empreendimento? O empreendimento diminui significativamente a taxa de permeabilidade e o contribuinte, através da prefeitura, paga pelo reservatório? O morador precisa gastar para construir sua caixa de retenção quando constrói, reforma ou amplia sua casa (Art. 24 da Lei 2288/1997). Será que todos os loteamentos não deveriam executar seus próprios reservatórios de retenção temporário de águas pluviais para não onerar a prefeitura e, consequentemente, não onerar o contribuinte?

3. Hoje existem poucas casas construídas nesse novo loteamento. As vazões irão aumentar quando todo o loteamento estiver ocupado. Espera-se que este reservatório tenha capacidade para reservar o volume de água de uma chuva intensa quando todas as moradias estiverem construídas e 100% da área esteja impermeabilizada. Sim, 100%, porque conforme palavras de outro vereador em outra ocasião, não existe fiscalização efetiva e “quando você vai ver, está 100% impermeabilizado”;

4. No Loteamento Araucária, no São Luís, que araucária tem só no nome, já que todas existentes foram cortadas, aconteceu algo parecido. O loteamento foi feito e, pouco depois, a prefeitura refez a rede de drenagem a jusante do loteamento. Por quê? Seria sobrecarga da vazão devido ao loteamento?

5. Seria importante os vereadores fiscalizarem se todas as obras que foram construídas após 18/06/2019 têm caixa de retenção de escoamento pluvial. Nessa data foi sancionada a Lei 4.181/2019, cujo projeto de lei foi elaborado por vereadores e aprovado pela maioria dos vereadores. O vereador que elogiou a Prefeitura parece não saber que, por exemplo, em pelo menos uma obra que foi construída pela própria Prefeitura depois de 2019, esse dispositivo não aparece no projeto e, questionada através do e-ouve, afirma que realmente não foi feito;

6. Em outras obras da prefeitura que estão sendo reformadas, ampliadas ou construídas, essas caixas de retenção parecem que não existem no projeto ou que não têm a capacidade especificada na lei. O vereador que está preocupado com as enchentes verifica se os projetos das obras municipais estão atendendo o Art. 24 da Lei das Construções 2.288/97?

7. A partir de 18/06/2019, a prefeitura e os vereadores tem verificado os projetos e fiscalizado as obras de particulares? Todas têm caixas de retenção de escoamento pluvial conforme manda a lei? O vereador preocupado com enchentes tem verificado nessas construções se esse dispositivo está sendo previsto, instalado e apresenta condições de operação?

Claro que a limpeza e manutenção das drenagens urbanas é sinal de um bom trabalho do Executivo, mas há muito mais o que se observar e fiscalizar e, os vereadores, no meu modo de ver, poderiam fazer isso, já que elaboram e aprovam leis que interferem no meio urbano e no meio ambiente.

Só elogiar ou só criticar, não ajuda muito. É indispensável uma avaliação criteriosa da realidade, embasada em dados e avaliações técnicas.

E considerando que em breve vereadores irão analisar e aprovar a revisão do Plano Diretor, é necessário que o debate seja técnico, amplo e democrático, principalmente quando a revisão do plano parece ter sido elaborada sem a participação efetiva da população.

Na apresentação do plano, em 07/12/2022, pela equipe que fez a revisão, o vereador Roberto de Almeida prometeu que haveriam muitas audiências públicas para a população apresentar suas dúvidas, sugestões e se promover um debate técnico e aprofundado de um tema tão importante. Vamos aguardar.

Nessa revisão do plano a taxa de permeabilidade de quase todas as áreas dentro do perímetro urbano é de apenas 30%.

Se hoje a área periurbana apresenta taxa de permeabilidade que deve se aproximar de 70% a 90% (estimativa grosseira) e no passado recente já tivemos inúmeras ocorrências de enchentes, imaginem quando apenas 30% se tornar permeável, se não for 0% caso não se melhorar a fiscalização.

Por último, ainda considerando a revisão do Plano Diretor, devemos lembrar que vivemos num momento de mudanças climáticas.

Os atuais planos municipais de resiliência à mudança climática impõem que na área urbana o aumento da temperatura pode ser minimizado através da arborização urbana.

Portando, atualmente é imprescindível que as cidades ordenem o zoneamento e o planejamento urbano considerando os efeitos do aquecimento local (ilhas de calor) e o aquecimento global através de implementação de planos sérios de arborização e restrições ao aumento de impermeabilização, do adensamento das construções e que favoreçam áreas verdes que influenciam na dinâmica dos ventos e na minimização de ilhas de calor. Tudo ao contrário do que eu li na minuta da revisão do Plano Diretor.

Por aqui, parece que ainda vivemos no século retrasado, afinal, continuamos a admitir taxa de permeabilidade de apenas 30%, o forte adensamento urbano e, até hoje não temos um plano municipal de arborização urbana. E na revisão do Plano Diretor, o plano de arborização, que já deveria existir, tem prazo de até dois anos para ser elaborado.

E se a Câmara Municipal admitir calçadas com largura inferior a 2 metros, pode esquecer arborização urbana nas ruas existentes que ainda são de terra e não têm calçadas.

Precisamos discutir todos esses e outros assuntos de forma mais técnica e mais aprofundada.

Neste momento, o futuro depende do bom senso e da boa vontade dos vereadores.

Fontes:

https://www.vivaserranegra.com/2022/12/marcelo-de-souza-o-novo-plano-diretor_3.html

https://www.vivaserranegra.com/2020/01/cidade-as-medidas-contra-as-enchentes.html

https://www.vivaserranegra.com/2021/09/cidade-camara-aprova-mais-uma-ampliacao.html

https://www.vivaserranegra.com/2019/05/fala-cidadao-as-causas-das-enchentes.html

https://www.vivaserranegra.com/2019/06/fala-cidadao-camara-deveria-reprovar-o.html

https://www.vivaserranegra.com/2021/08/opiniao-plano-diretor-asfalto-e.html

https://www.circuitodenoticias.com.br/5831/chuvas-de-mais-de-60-milimetros-atingiram-a-

cidade-segundo-o-ciagro

https://www.serranegra.sp.gov.br/noticias/prefeitura-age-rapidamente-para-coibir-efeitos-

de-chuva-com-volume-mais-alto-nos-ultimos-oito-anos-1358

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Marcelo de Souza é engenheiro civil



Comentários

  1. Excelente artigo! Serra Negra precisa ter uma fiscalização mais eficiente e o cumprimento das leis municipais. Depois que ocorre um deslizamento ou uma enchente, não só os atingidos sofrem, mas também os cofres públicos. Melhor previnir que remediar.

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