//CRÔNICA// O público e o privado. E essa mistura indigesta



Carlos Motta

Dias atrás, a página oficial da prefeitura no Facebook publicou uma notícia, recheada de fotos, sobre um empreendimento comercial privado que iria ser inaugurado em Serra Negra. 

Pelo pouco que sei das coisas, publicações do Executivo, sejam onde for, têm de ser de interesse público. 

O prefeito, o governador, o presidente, não podem encher os veículos oficiais com textos e fotos louvando a si mesmos ou o que fazem.

Estão usando dinheiro público para publicidade.

Do mesmo modo, não se deve permitir que os canais oficiais sejam usados para destacar negócios privados.

Se formos encarar tal prática como normal, vamos ter de rever alguns conceitos sobre moralidade na administração pública.

Existe, por exemplo, um troço chamado de princípio da isonomia: se a empresa X pode sair na publicação da prefeitura, a empresa Y tem o mesmo direito. E a empresa Z, e a empresa B, a empresa A...

Dá para entender a bagunça que uma publicação dessas pode ocasionar?

Outro complicador para essa historinha é o fato de que algum funcionário da prefeitura serrana gastou seu tempo, que é pago com o dinheiro dos contribuintes, ou seja, com o nosso dinheiro, para fazer um trabalho que beneficia um particular.

Até as pedras sabem que no Brasil essa diferenciação entre o público e o privado é ignorada por uma grande parcela da população. Muitos políticos, especialmente, não veem problema algum em misturar as duas coisas. 

Eu mesmo já vi por mais de uma vez um ex-prefeito de Serra Negra pegar comida no restaurante, em pleno domingo, com um carro oficial.

Sérgio Buarque de Holanda, o pai do Chico, descreveu bem esse hábito do brasileiro de usar o bem público para fins privados no seu clássico "Raízes do Brasil".

Esse costume é secular, aportou por aqui com os portugueses para nunca mais ir embora.

Serra Negra, obviamente, sofre do mesmo mal.

Sem se renovar politicamente há décadas, a prática se entranhou na cidade e é vista como algo comum, corriqueiro, sem maiores consequências.

Afinal, qual o problema de a gente usar a velha conhecida Lei de Gerson, aquela que diz que o importante é levar vantagem em tudo?

Afinal, aqui é o Brasil, não a Suíça. Ou a Suécia. Ou esses lugares que pretendem ser "certinhos".

Afinal, não existe pecado do lado de baixo do Equador, escreveu e cantou Chico Buarque, o filho do Sérgio.



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