//ANÁLISE// Cloroquina virou política de governo

                                                                                                                     


Fernando Pesciotta


Em sua última live, Jair Bolsonaro se mostrou irritado por ser chamado de “capitão cloroquina”, mas deu sinais de que pode ter sido criminosa sua defesa de um medicamento sem eficiência comprovada para combater o coronavírus. “Se era placebo, paciência, errei, mas não matei ninguém”, reagiu.

O escândalo em que se transformou a defesa do uso da cloroquina motiva várias frentes de atuação da Justiça. O ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, é alvo de ação do STF. A Procuradoria da República no DF apura improbidade do governo, e se houver crime de responsabilidade, Bolsonaro deverá responder.

Agora, o jornal Folha de S. Paulo revela que o capitão cloroquina usou a estrutura de Estado para promover o remédio, torrando dinheiro público.

Segundo a reportagem publicada no último final de semana, o capitão cloroquina mobilizou cinco ministérios, uma estatal, dois conselhos da área econômica, Exército e Aeronáutica para a distribuição do produto. Essa frente de trabalho tornou-se “política de governo”.

A cloroquina, que teria sido comprada a preços superfaturados pelo Exército, foi distribuída principalmente nas regiões mais carentes do Brasil, como o Nordeste e o Norte, onde as pessoas morrem por falta de oxigênio. E o capitão cloroquina diz que não matou ninguém?

O próprio governo reconhece que foram distribuídos 5,4 milhões de comprimidos de cloroquina e 481.500 de hidroxicloroquina. Os devotos do fundamentalismo bolsonarista difundiram a “cura” pela cloroquina. Quanto morreram por causa dessa irresponsabilidade?

Enquanto isso, o País acusa falta de verbas, insumos e recursos humanos para identificar variantes do vírus. A nova cepa existente em Manaus foi identificada no Japão.

As mortes vão se somando. O Brasil contabiliza 492 óbitos por covid-19 nas últimas 24 horas, com total 231.561 desde o começo da pandemia. Já são 18 dias seguidos com a média acima de mil.

Mas a preocupação do capitão cloroquina é com o cargo. Ele divide com o Centrão um fatiamento do governo para assegurar o apoio do bloco contra um pedido de impeachment e na eleição de 2022.

Depois de alcançar o poder na Câmara e no Senado, o Centrão prepara uma lista de cargos que pretende ocupar, como o comando do Banco do Brasil e da Casa da Moeda.

O bloco está de olho também nos ministérios da Saúde, de Minas e Energia e de Infraestrutura, todos com ministros militares. Quer, ainda, cargos nos ministérios da Cidadania e do Desenvolvimento Regional, controlados por políticos de carreira.

Enquanto o capitão cloroquina e o Centrão se divertem no parque de diversões, cadê o ministro da Saúde?

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Fernando Pesciotta é jornalista e consultor em comunicação. Contato: fernandopaulopesciotta@gmail.com                                                                      

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