//ANÁLISE// Nuvem de gafanhotos

                                                                                                       


Fernando Pesciotta


Enquanto todas as atenções estão voltadas ao assassinato em massa na área da saúde, o desgoverno de Jair Bolsonaro avança em outras frentes como se fosse uma grande nuvem de gafanhotos.

É muito grave o que ocorre, por exemplo, na educação. A imposição da realização do Enem no último final de semana, com outro exame no próximo domingo, é uma demonstração da irresponsabilidade de gente que não está nem um pouco preocupada com a educação dos jovens brasileiros.

Entidades do setor cansaram de pedir o adiamento das provas por causa da pandemia. Além do risco natural provocado pelas aglomerações, nesse momento há um fosso entre alunos ricos, com toda a estrutura para as aulas on-line, e pobres, com pouco ou nenhum acesso à internet para manter os estudos na pandemia e mais dependentes de transporte público. O resultado será injustamente desigual.

Recentemente, liderei um trabalho que expunha a polêmica da volta às aulas em 2021. O tema é controverso. Há bons argumentos a favor e ótimos argumentos contra a retomada das aulas presenciais. Mas com um consenso: a total nulidade do MEC nas discussões.

Além da pressão de pais, especialistas avaliam que as crianças não podem mais ficar longe da escola, sob risco de perdas irrecuperáveis no aprendizado. Argumentam que as escolas estão preparadas para minimizar ao máximo os riscos de contágio do covid, com bons protocolos de segurança.

Outros consideram precária a retomada porque professores e funcionários não foram imunizados nem estão na lista prioritária para vacinação. E duvidam que todas as escolas públicas estejam enquadradas nas regras de segurança. Antes da pandemia, muitas delas nem papel higiênico tinham. Nesse caso, novamente a retomada vai ampliar a distância entre ricos e pobres.

No primeiro dia de provas do Enem, a abstenção foi de 51,5% dos inscritos, recorde histórico. E ficou provado que o sinistro da Educação, pastor Milton Ribeiro, mentiu quando disse que todas as escolas estavam preparadas para receber os estudantes em tempos de pandemia.

Em muitos locais de prova, em todo o País, houve candidatos impedidos de fazer o exame por causa da superlotação das salas. A distribuição dos candidatos por sala é responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), vinculado ao MEC.

O Inep jurava de pés juntos que havia ampliado o número de salas para receber todos os candidatos com a segurança necessária. Sua irresponsabilidade e incompetência ajudaram a compor o recorde de abstenção. Se não havia salas suficientes como prometido, por que acreditar que todas as escolas estão preparadas para a volta às aulas?

Além do descaso do governo com questões sociais das mais relevantes para o País, o aparelhamento da máquina pública ajuda a explicar esse profundo buraco em que nos meteram.

O presidente do Inep, Alexandre Lopes, é engenheiro químico e analista de comércio exterior. O secretário de Avaliação Básica do Inep era o general Carlos de Souza, que morreu de covid cinco dias antes do Enem, e ainda não se sabe qual militar o substituirá.

A educação é prioridade em qualquer país desenvolvido. Mas não dá para imaginar que o Brasil seja capaz de avançar na pedagogia se os formuladores de políticas públicas para a educação não são do ramo e outros vieram dos quartéis.

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Fernando Pesciotta é jornalista e consultor em comunicação. Contato: fernandopaulopesciotta@gmail.com                                                                      

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