//ECONOMIA// Repiques de preços dão sensação de inflação em alta


Salete Silva


Os reajustes de preços e o aumento da inflação nos últimos meses têm intrigado os consumidores.  Com a queda brutal no nível de atividade econômica, a previsão para 2020 é de uma inflação de 1,72%, a menor desde 1998.

Mas a sensação no bolso e no orçamento, reclamam os brasileiros, é de que os preços estão em alta e que os aumentos ocorrem em ritmo mais acelerado do que mostram os indicadores de inflação.

Os gastos com alimentos pesaram mais logo após o início da pandemia. Depois, o custo de vida foi pressionado pelos reajustes das tarifas de combustíveis e energia elétrica.

Agora são os aumentos dos preços dos materiais de construção que pressionam o orçamento. Quem sente mais no bolso são os consumidores que iniciaram alguma reforma ou pequena obra durante a quarentena.  

Reajustes de preços e a variação da inflação estão diretamente relacionados com o movimento de oferta e demanda. Os preços tendem a subir quando cresce a demanda pelo consumidor ou quando diminui a oferta de produtos e serviços.

Com a economia patinando, a demanda desaquecida, os índices de inflação já davam sinais de estabilidade antes mesmo do início da pandemia, quando o Banco Central também começou a refazer para baixo a previsão do PIB (Produto Interno Bruto) em 2020.

A corrida dos consumidores às compras no início da pandemia provocou uma alta de preços no supermercado de até  106%, segundo pesquisa realizada em maio, pela Associação de Consumidores Proteste.

As despesas com alimentação no domicílio foram as que mais cresceram. O feijão carioca chegou a ficar, segundo a pesquisa, 66% mais caro.

No mês passado, no entanto, com a retomada da economia e mais pessoas retornando ao trabalho, a situação começava a inverter e os gastos com alimentação no domicílio a diminuir.

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mostrou uma alta de 0,14% no item alimentação, menor do que a variação média de 0,36% dos preços que compõem o indicador.

Em vez da alimentação, em julho, os combustíveis e a conta de luz passaram a puxar o custo de vida. Os gastos com gasolina aumentaram 3,42% e as tarifas de energia elétrica ficaram 2,59% mais caras.

Agora, a pressão sobre o custo de vida vem também dos gastos com materiais de construção. Um aumento de demanda, dizem especialistas da área, pode estar provocando os reajustes dos preços do setor.

Além da liberação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que deverá injetar R$ 36 bilhões na economia, o auxílio emergencial despeja mais R$ 50 bilhões todos os meses no mercado.

Especialistas e empresários da construção avaliam que a liberação de recursos desses dois programas sociais pode explicar o aumento de 8,3% nas vendas de materiais de construção, segundo a Associação Brasileira de Material de Construção (Abramat).

Com alguma folga no orçamento e mais tempo dentro de casa, o consumidor, analisam, optou por realizar pequenas reformas ou obras residenciais. Além disso, o trabalho em home office motivou obras em casa e em escritórios.

O crescimento da demanda por materiais de construção pode ser a explicação para o aumento de preços dos insumos, registrado por uma pesquisa realizada pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção, entre 462 empresas de 25 estados brasileiros, no período de 16 a 21 de julho.

O levantamento constatou reajustes nos materiais em torno de 10%, mas em alguns casos chegam a mais de 20%. A pesquisa apurou, por exemplo, que 59% dos entrevistados registraram aumento de 10% no preço do cimento.

O custo do aço também teve reajuste de até 10%, segundo 55% dos empresários. Para 32% dos entrevistados, o aço chegou a ter reajuste acima de 10%.

O setor pode ter se aproveitado do aumento da demanda para reajustar os preços, mas dificilmente, avaliam analistas, esse movimento de alta deverá se manter.  

O setor de construção, apesar do ligeiro aquecimento, deverá encerrar 2020 com uma queda no nível de atividade de 7%, segundo previsão da Abramat e a Fundação Getulio Vargas.

O nível de atividade econômica de forma geral deverá permanecer em níveis muito baixos até o fim do ano. A expectativa do Banco Central é de uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) menor do que a inicial, mas ainda assim de 5,52%.

A taxa de desemprego continua elevada, em 13,1%, com 12,4 milhões de desempregados. Além disso, a base de comparação dos indicadores econômicos que mostram alguma reação da economia é muito baixa.

Sem uma demanda consistente, apesar de todos esses repiques de preços, a inflação em 2020 não deverá, segundo os analistas, chegar a 2%.

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