//ANÁLISE// Bolsonaro está mentindo para proteger os filhos?


Fernando Pesciotta

Um faceiro presidente Jair Bolsonaro convocou ontem uma entrevista coletiva de imprensa, com três jornalistas, sendo um da emissora do governo, para anunciar que seu teste para Covid-19 deu positivo. Ele não mostrou o exame. Logo depois de fazer o anúncio, Bolsonaro tirou a máscara para falar com os jornalistas. 

A julgar pela reação das redes sociais, porém, ele está mentindo. Vários argumentos estão sendo utilizados para sustentar a tese de que Bolsonaro, tão familiarizado com fake news,e considerado um mitômano, estaria apenas construindo uma narrativa a ser repetida por seus seguidores. 

Não sei, mas em se tratando desse personagem, tudo é possível.

 Vejamos os argumentos. Primeiro: ao fazer o anúncio nesta terça-feira, 7 de julho, Bolsonaro tirou completamente do foco o depoimento que seu filho Flávio prestou ao MP sobre o desvio de dinheiro público em seu gabinete de deputado no Rio de Janeiro. Por 18 meses Flávio evitou o depoimento. O caso é popularmente conhecido como “rachadinha”. De fato, essa notícia praticamente desapareceu da mídia.

Segundo: com coronavírus, ele próprio tem um argumento para fugir de seu depoimento no inquérito pedido pelo STF que apura suposta influência de Bolsonaro na Polícia Federal. Conforme a denúncia, o presidente quer ter o controle da polícia para evitar que ela chegue a seus filhos e amigos no Rio de Janeiro. Quem concorda com isso lembra que Bolsonaro já deu várias demonstrações de que é capaz de tudo para proteger seus filhos. E se autoproteger, pois um suposto esquema de corrupção não teria sido inventado pelos filhos, mas herdado por eles. Fabrício Queiroz era assessor de Jair Bolsonaro muito antes de seus filhos se elegerem.

Terceiro: a mulher de Queiroz continua foragida. Nunca se viu alguém ser tão bem-sucedido numa fuga. Até seu marido, acostumado aos becos de Rio das Pedras, foi encontrado. O assunto sumiu da pauta.

Quarto: os ministérios da Saúde e da Educação continuam sem um comandante, enquanto o centrão deita e rola nas nomeações na máquina pública. Assuntos que ficam em segundo plano.

Quinto: a cloroquina. O anúncio de contágio de Bolsonaro se encaixaria com perfeição à sua narrativa de desprezo da doença. Não vai acontecer nada com ele, alegando que tomou cloroquina. O remédio milagroso, cuja eficácia é sem comprovação, seria o álibi para seu desatino. Basta tomá-lo para evitar mortes. Portanto, vamos acabar com essa palhaçada de isolamento, máscaras e todas essas frescuras. Talquei?

Sexto: dinheiro. Já surgiram suspeitas de desvio de recursos no processo de produção de cloroquina pelo Exército. E coincidentemente Bolsonaro exagera na propaganda do remédio. 

Sétimo: falta de contágio. Bolsonaro se encontrou com muitas pessoas nos últimos dias. Isso inclui o embaixador norte-americano em Brasília. Vários desses personagens já fizeram o teste e ninguém está com o vírus. Será um grande feito se ele estiver falando a verdade, e isso terá consequências e desdobramentos. 

A ver.
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Fernando Pesciotta é jornalista e consultor em comunicação. Contato: fernandopaulopesciotta@gmail.com

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