//PANDEMIA// Promotor é contra reabertura de restaurantes, bares, salões de beleza e academias


O Ministério Público do Estado de São Paulo, por meio do promotor de Justiça Gustavo Roberto Chaim Pozzebon, enviou na sexta-feira, 29 de maio, uma recomendação ao prefeito de Serra Negra, Sidney Ferraresso, para que revogue os artigos 2º, 3º e 4º do Decreto Municipal nº 5.052, de 22 de maio de 2020, "e edite norma municipal relativa à flexibilização da quarentena com nível de proteção igual ou superior ao estabelecido pela União e pelo Estado, observando, especialmente, as regras previstas no Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, sob pena de adoção das medidas judiciais cabíveis".

Os artigos do decreto municipal citados pelo promotor são os que permitirão o atendimento presencial, a partir de segunda-feira, 1º de junho, em restaurantes, bares, lanchonetes, pizzarias e padarias (artigo 2º), barbearias, salões de beleza, cabeleireiras e serviços correlatos (artigo 3º) e academias e similares (artigo 4º). Segundo a Promotoria de Justiça. esses artigos contrariam o disposto no Decreto Estadual nº 64.994.

Entre as considerações da mensagem enviada ao chefe do Executivo serrano, o promotor Roberto Pozzebon diz que o município não pode, "sem o embasamento em evidências científicas e em análises técnicas sobre as informações estratégicas em saúde, afastar-se das diretrizes estabelecidas pelo Estado de São Paulo", sob pena de violação ao pacto federativo e à divisão espacial do poder e de colocar em risco "os direitos fundamentais à saúde e à vida, ficando sujeito intervenção estadual, sem prejuízo da responsabilização pessoal do prefeito pela prática de crime previsto no Artigo 268 do Código Penal e de ato de improbidade administrativa".

Ele explica que Serra Negra tem de seguir o plano estadual de flexibilização da quarentena e por estar nos limites do Departamento Regional de Saúde VII (Campinas), o município está inserido na Fase 2 do Plano São Paulo, que veda o atendimento presencial em salões de beleza e barbearias, academias de esporte de todas as modalidades, consumo local em bares, restaurantes e similares e outras atividades que geram aglomeração.

Por fim, o promotor, "dada à excepcionalidade da situação e urgência da matéria", fixa o prazo de 24 horas para a prefeitura se manifestar sobre a recomendação.

A íntegra do documento enviado ao Executivo é a seguinte:

PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SERRA NEGRA
Praça Barão do Rio Branco, nº 81 - Centro | Serra Negra/SP
Tel: (19) 3892-4946 | e-mail: pjserranegra@mpsp.mp.br

RECOMENDAÇÃO
PAA nº 62.0445.0000080/2020-3
SEI 29.0001.0022270.2020-15
Objeto: medidas de prevenção e contenção do contágio pelo COVID 19
Destinatário: Prefeito Municipal da Estância Hidromineral de Serra Negra

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelo Promotor de Justiça que esta subscreve, tendo por base as medidas que estão sendo adotadas pelas autoridades sanitárias brasileiras no combate à propagação do CORONAVÍRUS (COVID 19);

Considerando a necessidade de acompanhar as políticas públicas de prevenção e contenção adotadas pelo Município de Serra Negra em relação ao denominado COVID – 19;

Considerando que persiste a declaração de emergência em saúde pública de importância internacional (ESPII) feita pela Organização Mundial da Saúde, em 30/01/2020, em virtude da pandemia do novo coronavírus (COVID - 19), e continuam em vigor o Decreto Legislativo nº 06, de 20 de março de 2020, que reconheceu a ocorrência do estado de calamidade pública, com efeitos até 31 de dezembro de 2020, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada ao Congresso Nacional por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020, e a Portaria GM n. 188, de 03/02/2020, pela qual o Ministério da Saúde declarou a situação de emergência em saúde pública de importância nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus (COVID - 19);

Considerando que os Municípios, no exercício de sua competência legislativa suplementar em matéria de saúde, somente estão autorizados a intensificar o nível de proteção estabelecido pela União e pelo Estado, mediante a edição de atos normativos que venham a tornar mais restritivas as medidas concebidas pelos referidos entes federativos quanto ao desempenho das atividades econômicas, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal (ADI 6341 e ADPF 672);

Considerando que o Supremo Tribunal Federal, além de reconhecer que a necessidade de medidas de distanciamento social constitui opinião unânime da comunidade científica nacional e internacional, sublinhou que a Corte “tem jurisprudência consolidada no sentido de que, em matéria de tutela ao meio ambiente e à saúde pública, devem-se observar os princípios da precaução e da prevenção. Portanto, havendo qualquer dúvida científica acerca da adoção da medida sanitária de distanciamento social – o que, vale reiterar, não parece estar presente – a questão deve ser solucionada em favor do bem saúde da população.” (ADPF nºs 668 e 669);

Considerando as inúmeras decisões do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no sentido da competência dos Municípios para incrementar, jamais flexibilizar, as restrições das atividades econômicas impostas pela União e Estado no combate à epidemia, inclusive no que diz respeito às atividades consideradas essenciais, a exemplo da limitação do horário de funcionamento de postos de combustíveis (TJSP; Agravo de Instrumento 2070095-26.2020.8.26.0000; Relator (a): Paulo Barcellos Gatti; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro de São Bernardo do Campo - 1ª Vara da Fazenda Pública; Data de Registro: 05/05/2020) e a suspensão da atividade hoteleira (TJSP; Agravo de Instrumento 067273-64.2020.8.26.0000; Relator (a): Décio Notarangeli; Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Público; Foro de Campos do Jordão - 1ª Vara; Data de Registro: 29/04/2020);

Considerando, enfim, que o MUNICÍPIO, no exercício de sua competência legislativa suplementar na edição de atos normativos voltados ao combate do COVID-19, não pode, sem o embasamento em evidências científicas e em análises técnicas sobre as informações estratégicas em saúde, afastar-se das diretrizes estabelecidas pelo Estado de São Paulo, sob pena de violação ao pacto federativo e à divisão espacial do poder instrumentalizada na partilha constitucional de competências e de colocar em risco os direitos fundamentais à saúde e à vida, ficando sujeito intervenção estadual (art. 47, VIII, Constituição Paulista e art. 35, IV, Constituição Federal), sem prejuízo da responsabilização pessoal do Prefeito Municipal pela prática de crime previsto no art. 268 do Código Penal e de ato de improbidade administrativa (art. 11 da Lei nº 8.429/92);

Considerando que o Governo Estadual, através do Decreto Estadual nº 64.881, de 22 de março de 2020, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto Estadual nº 64.975, de 13 de maio de 2020, pautado em informações técnicas e científicas, adotou a quarentena no Estado de São Paulo por meio da “restrição de atividades de maneira a evitar a possível contaminação ou propagação do coronavírus”;

Considerando que o Estado de São Paulo, por meio do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, que dispõe sobre a quarentena de que trata o Decreto Estadual nº 64.881/2020 e institui o Plano São Paulo, determinou a continuidade da quarentena até o dia 15 de junho de 2020 (art. 1º);

Considerando que o art. 7º do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, prevê a flexibilização da quarentena em determinadas regiões do Estado, e em relação a determinados setores da atividade econômica, estabelecendo fases (vermelha, laranja, amarela e verde) para a retomada do atendimento presencial ao público de serviços e atividades não essenciais;

Considerando que o art. 7º do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, condiciona a retomada gradual do atendimento presencial ao público de serviços e atividades não essenciais a ato fundamentado do Prefeito, a partir de circunstâncias estruturais e epidemiológicas favoráveis;

Considerando que, nos termos do art. 7º, par. único, 1, do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, o ato do Prefeito, que autoriza a retomada gradual das atividades, deve observar o disposto no Anexo III do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020;

Considerando que, conforme o Anexo III, a que se refere o item 1 do par. único do art. 7º do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, continua vedado, para os Municípios inseridos na Fase 2 (laranja), o atendimento presencial em salões de beleza e barbearias, academias de esporte de todas as modalidades, consumo local em bares, restaurantes e similares e outras atividades que geram aglomeração (https://www.saopaulo.sp.gov.br/coronavirus/planosp/);

Considerando que o Município de Serra Negra localiza-se nos limites do Departamento Regional de Saúde - DRS-VII (Campinas), estando, portanto, nos termos do Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, atualmente inserido na Fase 2 (laranja);

Considerando que o Decreto Municipal nº 5.052, de 22 de maio de 2020, editado pelo Exmo. Prefeito Municipal da Estância Hidromineral de Serra Negra, com vigência a partir do dia 1º de junho de 2020, permite o atendimento presencial em restaurantes, bares, lanchonetes, pizzarias e padarias (art. 2º), barbearias, salões de beleza, cabelereiras e serviços correlatos (art. 3º) e academias e similares (art. 4º), e, dessa forma, contraria o disposto no Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020;

Considerando que os direitos fundamentais à saúde e à vida garantidos pela Constituição Federal (art. 5º, caput, e 6º, caput) prevalecem em relação aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, IV, CF), segundo critério de ponderação de valores;

Considerando que é função institucional do Ministério Público o exercício da defesa dos direitos assegurados na Constituição Federal sempre que se cuidar de garantir-lhes o respeito pelos Poderes Estaduais (art. 129, II, da Constituição Federal, art. 103, VII, “a”, da Lei Complementar nº 734/93);

Considerando que incumbe ao Ministério Público expedir recomendações ao Poder Público (art. 113, § 1º, da Lei Complementar nº 734/93, art. 27, IV, da Lei nº 8.625/93 e arts. 6º, XX, e 13, da Lei Complementar nº 75/93) visando ao respeito aos interesses cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo para a adoção das providências cabíveis;

RECOMENDA a Vossa Excelência, DD. Prefeito Municipal da Estância Hidromineral de Serra Negra, que revogue os arts. 2º, 3º e 4º do Decreto Municipal nº 5.052, de 22 de maio de 2020, e edite norma municipal relativa à flexibilização da quarentena com nível de proteção igual ou superior ao estabelecido pela União e pelo Estado, observando, especialmente, as regras previstas no Decreto Estadual nº 64.994, de 28 de maio de 2020, sob pena de adoção das medidas judiciais cabíveis.

Fica fixado o prazo de 24h para resposta, dada a excepcionalidade da
situação e urgência da matéria.

Serra Negra, 29 de maio de 2020.
Gustavo Roberto Chaim Pozzebon
Promotor de Justiça

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