//TURISMO// "Temos de arrumar a nossa casa"

Luciana Ramos: famtour é essencial para qualificar trabalhadores e empresários

Salete Silva

Serra Negra é um dos locais mais apreciados pelos turistas, segundo o prêmio Top Destinos Turísticos 2019, mas para chegar ao topo desse pódio e usufruir do status de cidade turisticamente desenvolvida, precisa aprimorar a cadeia produtiva do setor - da qualificação da mão-de obra à criação de novas atrações.

A avaliação é da guia de turismo Luciana Silva Ramos, integrante do Conselho Municipal de Turismo (Comtur) de Serra Negra, recém-empossado. “Temos de arrumar a casa e nos estruturarmos, até mesmo para podermos ampliar os investimentos por meio de iniciativas como a cobrança da taxa de visitação”, afirma.

Para instituir uma taxa diária aos visitantes, destinada a um Fundo Municipal de Turismo (Fumtur), ela explica, o município precisa contar com um fluxo de turismo intenso e com uma boa infraestrutura de receptivo, como ocorre em Campos do Jordão, por exemplo, que impõe até limites à entrada diária de ônibus por excesso de demanda. 

Alguns municípios vizinhos, no próprio Circuito das Águas, já contam com infraestrutura mais adequada e reconhecimento de suas qualidades: Socorro foi eleita este ano pela segunda vez consecutiva como Top Destino Turístico na categoria Turismo Social.

Até Monte Sião, cujo principal atrativo é o comércio de malhas, voltado em especial para o atacado, lembra Luciana, está mais organizada do que Serra Negra em alguns aspectos como na recepção de guias e ônibus na cidade. Além de não permitir a circulação de ônibus turísticos, conta com um estacionamento em um espaço cedido pela fábrica de cerâmica.

Além disso, são oferecidos ao motorista uma sala para descanso com sanitário e até vale almoço. Os guias do turismo também recebem tratamento especial, relata Luciana, que além do vale para almoço são convidados a participar de um famtour – passeio para conhecer o local e seus atrativos turísticos.

As limitações na infraestrutura do turismo serrano começam na falta de estacionamento exclusivo de ônibus. A cidade não dispõe de local apropriado para embarque e desembarque de turistas, o que é feito em geral na esquina da Rodoviária Municipal.  


Qualificação profissional


O padrão de atendimento de profissionais de todas as áreas também fica aquém do mercado. “Quantas vezes vi guarda municipal dizendo ‘vamos saindo logo, vamos saindo logo’ para o turista que descia de ônibus na porta de hotel”, relata.

Taxistas também precisam de treinamento para oferecer um bom atendimento aos turistas, assim como lojistas e balconistas, que não conhecem nem sabem quais são as atrações turísticas na cidade. O famtour, ela aponta, é essencial para qualificar não só trabalhadores, mas empresários e hoteleiros.

A cidade já teve bons cursos de turismo receptivo e hotelaria para pessoas a partir de 16 anos, ministrados pela escola municipal profissionalizante no início dos anos 2000. Havia alunos que procuravam qualificação para o primeiro emprego, outros que queriam sair do subemprego e havia até idosos com 75 anos. Os cursos, lembra a guia de turismo, cumpriam o papel de capacitar a população de uma cidade que tem no turismo a principal atividade econômica.



O último curso ministrado na cidade foi de habilitação de guia de turismo em 2017. “A qualificação é importantíssima, em especial neste momento em que há alto índice de desemprego de um lado e falta de qualificação do outro”, observa.

Na gastronomia, apesar do bom número de estabelecimentos comerciais, faltam, na avaliação da guia, detalhes importantes na apresentação, higiene e atendimento, incluindo restaurantes de hotéis. “O restaurante pode ser popular, mas tem de ter o pessoal devidamente uniformizado, de touquinha e com boa apresentação”, salienta.

Ela sugere a criação de um selo de qualidade para ser concedido aos estabelecimentos que cumprirem alguns critérios. “Seria como um Guia Quatro Rodas serrano para que o restaurante divulgasse e mostrasse que passou por um controle de qualidade.”


Comércio


Apesar dos gargalos na cadeia turística, Serra Negra, diz Luciana, é destino de turistas de diversas partes do país, de Florianópolis a Fernando de Noronha. “Somos conhecidos desde 1938, a demanda de turista cresceu por um tempo, mas os empresários e o setor público se acomodaram”, avalia.


"Todos perceberam que 

é hora de fazer alguma coisa, 

de sair da acomodação"


A crise econômica e em especial a competição com outros destinos, como cruzeiros e praias na baixa temporada, reduziram o fluxo de turismo. “Os empresários sempre estiveram desassistidos do poder público, o que também provocou o desestímulo”, salienta.

O turista procura Serra Negra, ela aponta, pela segurança, tranquilidade e comércio, que, não tem mais a mesma relevância, mas que ainda é um bom atrativo. O comércio de Serra Negra, ela avalia, é atraente por sua diversidade e funcionamento todos os dias da semana.

Monte Sião e Pedreira, por exemplo, têm comércio menos diversificado e mais segmentado na área de malhas e decoração, respectivamente. “O turista aprecia a variedade e quer fazer compras inclusive nos domingos e feriados”, afirma.

O comércio serrano, ela aponta, falha por não funcionar até mais tarde, em especial em duas épocas do ano, setembro, quando há movimento por causa da Expoflora, em Holambra, e em dezembro, nas vésperas de Natal.

“O Circuito das Águas inteiro vai para Amparo, por exemplo, onde o comércio fica aberto até mais tarde no fim do ano e a Ypê faz sua decoração de Natal”, afirma.


Perfil do turista


O perfil do turista também tem se modificado. As excursões são em geral da terceira idade, que tem disponibilidade para viajar nos fins de semana e nos dias úteis, mas o público está cada vez mais diversificado.

“Tenho atendido muitos jovens, grupos heterogêneos, e preciso de roteiros para contemplar essas faixas de idades diferentes”, afirma.

O poder aquisitivo também tem se diversificado. Até a primeira década dos anos 2000, segundo ela, havia um público também de maior poder aquisitivo. Mas isso foi se modificando, assim como os hábitos.



Entre os turistas de um dia, ela aponta, há grupos com bom poder aquisitivo. “Não se pode pensar em frango com farofa, porque há muito turista que vem do litoral, por exemplo, com poder aquisitivo bom para passar um dia”, afirma.

Ainda há muito espaço para crescer nesse segmento. Faltam consumidores, por exemplo, segundo a guia de turismo, para lojas com produtos mais refinados e caros. “Mas não podemos focar só nesse público, para não elitizar”, ressalva.

As programações culturais e de alta temporada, ela ressalta, devem ser anunciadas com meses de antecedência, para que os agentes de turismo possam divulgar e vender melhor os pacotes.


Receptivo


A estruturação do receptivo turístico no centro da cidade é outro calcanhar de Aquiles do turismo serrano apontado por Luciana. O Comtur deverá começar a estruturar esse serviço para atender a demanda de Natal e das férias de verão.

Essa área tem duas atuações, lembra Luciana. O receptivo da cidade que oferece informações locais, e as agências de receptivo, que dão atendimento aos ônibus e fazem contatos com os hotéis para vender os passeios. “O agente receptivo faz até o serviço de busca e leva do turista em aeroporto”, afirma.

A contratação de guias na região já está regulamentada pelo Consórcio do Circuito das Águas Paulista, com aval dos secretários das nove cidades integrantes. Deve haver um profissional por excursão, mais os guias turísticos do município.

Já o receptivo da cidade precisa de profissional qualificado que conheça os atrativos e todos os serviços oferecidos no município, da gastronomia, hotelaria e comércio às iniciativas públicas.

Mesmo com tantos desafios, a guia demonstra entusiasmo com as perspectivas do turismo em Serra Negra. “Todos os segmentos perceberam que é hora de fazer alguma coisa, precisamos, no entanto, de sair da acomodação e fazer um corpo a corpo nas ruas pelo turismo de Serra Negra”, conclui.




Comentários

  1. Parabéns pela matéria, Serra Negra precisa mudar ou vai acabar o turismo da cidade. Muito bom

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