//CIDADE// Trânsito vai passar por uma revolução

Principais pontos do plano foram apresentados pela professora Cândida Baptista

Salete Silva

A cada quatro anos, a média de vida do cidadão aumenta em um ano. A expectativa é que um número cada vez maior de cidadãos da atual geração já chegue aos 100 anos de idade. Nas próximas gerações chegarão a 150 anos.

As cidades precisam oferecer acessibilidade às gerações com maior expectativa de vida e promover a inclusão social. Mas mais do que isso, os municípios necessitam de um plano de mobilidade urbana para obter verbas estaduais e federais para seus projetos, conforme determina a lei federal de mobilidade urbana nº 12.587, de 2012.  

Serra Negra começou esta semana a discutir um plano de mobilidade urbana para o município, que deverá estar concluído para ser apreciado e aprovado pela Câmara municipal até setembro de 2020.

A primeira audiência pública para discutir o assunto foi realizada na terça-feira, 29 de outubro, no Mercado Cultural.

A iniciativa é resultado de um termo de cooperação firmado entre a Universidade São Francisco (USF), de Bragança Paulista, e o Consórcio do Circuito das Águas Paulista, com a intermediação da Associação dos Prefeitos dos Municípios de Interesse Turístico do Estado de São Paulo (Amitesp).

A importância da participação dos serranos na formulação do plano com propostas e sugestões foi um dos principais pontos destacados pela professora de planejamento urbano do curso de engenharia da USF, Cândida Baptista, durante a primeira audiência.

A professora é a coordenadora da equipe de estudantes dos cursos de arquitetura e engenharia da USF que vai formular a proposta com base nas informações que serão colhidas em entrevistas e questionários realizados entre moradores e turistas de Serra Negra.

“Se a sociedade não participa, vira um plano unilateral”, alertou Cândida. Vereadores e formadores de opinião devem levar as propostas da sociedade serrana aos formuladores do plano.

A ideia, explicou a professora, é que quando o plano for apresentado pelo Executivo à Câmara Municipal, os vereadores já estejam cientes de suas propostas, que serão discutidas por quase um ano.

A primeira audiência pública reuniu empresários do comércio, hotéis, propriedades agrícolas e turísticas, além de autoridades do Executivo, como o secretário de Planejamento, Antônio Roberto Siqueira Filho, o secretário de Obras, Jorge Ioriatti, o secretário do Meio Ambiente, José Osmar Stacheti, e o vereador Roberto de Almeida (PTB).

A prefeitura não terá custos na formulação do programa, garantiu Cândida. O único gasto previsto é com os salários dos estagiários, que serão custeados pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), estimado entre R$ 40 mil a R$ 60 mil no ano.

“A universidade não cobra pelo serviço de elaboração do plano de mobilidade urbana”, explicou a professora. “O custo é só dos estagiários contratados pelo CIEE, que ganham o salário mínimo.”

O interesse da universidade na elaboração gratuita do plano, segundo ela, é capacitar seus alunos para que possam, depois de formados, montar suas próprias consultorias para formular planos de mobilidades para municípios com mais de 100 mil habitantes.

O trabalho nos municípios de maior porte é muito mais extenso e, portanto, mais caro. Bragança Paulista, por exemplo, a professora citou, pagou R$ 800 mil só pela primeira fase de elaboração do plano.

Sua equipe já realizou sete projetos em pequenos municípios da região de Bragança e Campinas, como Morungaba, Bom Jesus dos Perdões, Piracaia, Joanópolis e Pedra Bela.

No Circuito das Águas, até o próximo ano, vai concluir os planos de mobilidade de Serra Negra, Águas de Lindoia e Pedreira.

O plano vai partir de alguns pontos fundamentais, além da consulta à população. Um deles é a inclusão da mobilidade de deficientes, idosos, mulheres com crianças e até analfabetos que têm dificuldade de ler os itinerários de ônibus.

O outro é a conscientização da população da necessidade de inversão das prioridades nas políticas públicas de mobilidade urbana, baseadas atualmente nos veículos particulares.

A prioridade tem de ser invertida. No topo da pirâmide da mobilidade urbana, aponta a professora, têm de estar os pedestres, ciclistas e transporte coletivo.

Para isso, além de ouvir a população, a equipe vai realizar um trabalho de conscientização nas escolas, em especial entre os alunos de ensino fundamental I e II e ensino médio.

O objetivo é disseminar a cultura entre as crianças e estudantes do uso da bicicleta para a locomoção diária. “As crianças que andam de bicicleta, como na China e Japão, se tornam adultos que usam a bicicleta como principal meio de transporte”, comparou.

Ela lembrou que a cultura de valorização do veículo particular veio da política de desenvolvimento econômico da ditadura militar, nos anos 1960 e 1970, e no governo de Juscelino Kubitschek.

A indústria automobilística foi a base do desenvolvimento econômico no governo JK. Para fazer o Brasil crescer 50 anos em 5 anos, como prometeu, ofereceu garantias de demanda a seus investidores.

Naquela época, com ajuda de um marketing agressivo, o veículo automotor se tornou o sonho de todo brasileiro. “O carro passou a representar o sucesso e todo mundo passou a trabalhar para comprar um carro novo”, lembrou Cândida. O que temos hoje, concluiu a professora, é cidades com trânsito saturado por causa do excesso de veículos automotores.

A proposta é inverter essa pirâmide. Tirar o carro do desejo principal, trabalhando primeiro a educação, ensinando as crianças a andar de bicicleta. “Vamos às escolas fazer dinâmicas em sala de aula.”

Promover o desenvolvimento da cidade também é o objetivo do plano de mobilidade urbana, que estimula a criação de projetos que resultam em liberação de verbas.  

Empresários presentes à audiência lembraram que em 2014 já foi feita uma tentativa de realizar um plano de mobilidade, incluindo uma campanha para que moradores e empresários deixassem seus carros em casa.

Faltou adesão tanto da iniciativa privada quanto da pública para que o projeto evoluísse. “Isso não vai acontecer porque tudo o que começamos, terminamos”, disse a professora.

O plano de mobilidade urbana de Serra Negra com as propostas será concluído e entregue ao Executivo, garantiu a professora. A Câmara terá de aprová-lo e o Executivo colocá-lo em prática.

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