//FERNANDO PESCIOTTA// Crocodilo



Por alguma razão, hoje acordei com uma canção na cabeça, aquela do grande portelense Manacéa que fez sucesso com Paulinho da Viola. Talvez por lembrar que Paulinho da Viola vai cantar na posse de Lula no dia 1º de janeiro, talvez por que o artista acabou de completar 80 anos ou por que foi dele o primeiro show que assisti no “pós”-pandemia.

Ah, quantas lágrimas eu tenho derramado, só em pensar que não posso mais reviver o meu passado... mas hoje em dia eu não tenho mais, a alegria dos tempos atrás.

Uma coisa leva à outra, e então me vem à lembrança outra canção que fez sucesso na voz de Paulinho da Viola, essa de sua própria autoria: “Quero chorar, não tenho lágrimas que rolem nas faces pra me socorrer, se eu chorasse talvez desabafasse o que sinto no peito e não posso dizer, só porque não sei chorar eu vivo triste a sofrer”.

O pensamento parece uma coisa à toa, mas como a gente voa quando começa a pensar. Nunca chorei pelos quase 700 mil mortos na pandemia, nem lamentei que não tenha lhes dado um tratamento mais digno.

Poderia ter ao menos manifestado solidariedade com as famílias que sofreram esse pesadelo, lamentado que zombei de quem padecia. Falei para pararem de chorar, pararem de mimimi, e agora quem chora do nada sou eu.

Quando aquelas mulheres, que pareciam as de Atenas, sofriam à procura dos restos mortais de seus filhos levados pela ditadura militar, eu até zoei, disse que elas pareciam cachorros atrás de ossos.

Também não derramei uma única lágrima pelas mortes de gente que ajudou o Brasil ser o que é.  Gal Costa, Aldir Blanc, Rolando Boldrin, Erasmo Carlos se foram e eu nem liguei.

Agora está lá o Pelé, maior marca exportada pelo Brasil, numa situação difícil e eu só sei chorar por mim mesmo, porque perdi, meu golpe não deu certo e posso ser preso. Choro porque estou no maior cagaço.

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Fernando Pesciotta é jornalista e consultor em comunicação. Contato: fernandopaulopesciotta@gmail.com




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