//VIOLÊNCIA DOMÉSTICA// O pedido do juiz aos jovens estudantes: tratem as meninas com respeito

Juiz Carlos Eduardo Silos de Araújo: 
“Se a menina não quer mais, você segue a vida, deixe-a em paz”


A violência contra a mulher pode parecer conversa de adulto, mas os olhos atentos dos alunos de 11 a 14 anos da Escola Estadual Professora Amélia Massaro para a palestra do juiz da Comarca de Serra Negra Carlos Eduardo Silos de Araújo revelam que no país 5º colocado no ranking mundial de feminicídio, a questão não só interessa aos jovens como pode fazer parte do cotidiano de muitos deles.

A convite da direção das escolas e do Conselho Comunitário de Segurança de Serra Negra (Conseg) o juiz vai proferir várias palestras aos estudantes da rede estadual durante este mês, dedicado à campanha Agosto Lilás de conscientização sobre o combate à violência doméstica e divulgação da Lei Maria da Penha, que protege a mulher e pune os agressores.

A Escola Estadual Professora Amélia Massaro foi a primeira a receber o juiz, na quarta-feira, 24 de agosto. “O assunto que vamos tratar hoje é muito importante e espero levar uma informação para vocês que sirva para o futuro e quem sabe para os dias atuais”, disse o juiz. 

Ele se dirigiu aos meninos lembrando que os tempos são outros e que muitas condutas consideradas normais antigamente estão ultrapassadas. “Tenho muita esperança na geração de vocês, meninos. A minha geração, tenho 47 anos, foi criada em outro mundo em que algumas condutas eram consideradas normais, embora fossem erradas”, disse.

O juiz pediu aos meninos para que tratem as meninas com respeito, dignidade e que compreendam que as mulheres não são propriedades dos homens e que elas têm liberdade para fazer escolhas. Ele explicou que em um relacionamento, seja de namorados ou casados, a decisão sobre o rompimento tem de ser respeitada.

“Se a menina não quer mais, você segue a vida, deixe-a em paz”, aconselhou. O juiz relatou que no dia a dia o que se constata é que quando algumas mulheres desejam se separar, os homens não aceitam e "infernizam" a vida delas. “Nós precisamos educar os meninos para que aceitem a decisão das meninas”, salientou.

Ao se dirigir às meninas, o juiz aconselhou que se afastem de meninos com comportamentos mais agressivos e sem escrúpulos. O juiz reconheceu que esse aconselhamento pode até ser criticado e considerado politicamente incorreto, mas explicou que se baseia nos processos que tramitam no fórum criminal e de família.

“O testemunho que estamos dando aqui tem origem em fatos ocorridos em Serra Negra com pessoas que talvez vocês conheçam ou que moram próximo da casa de vocês”, explicou.

O juiz aconselhou as meninas a ficarem atentas ao comportamento das pessoas com quem se relacionam. Ele ressaltou que pessoas com comportamento adequado em algum momento na vida podem se tornar agressivas, violentas e possessivas.

Mas não é isso o que se observa na vara criminal. Quando a mulher faz a denúncia na delegacia, em geral já sofreu várias agressões anteriormente. Além disso, elas relatam que já tinham suspeitas e muitos indícios de que a pessoa com quem se relacionam ou estão casadas tinha propensão a praticar violência contra a mulher.

“Se você tem um namorado que gosta de brigar, gosta de bater em outros meninos, quer levar vantagem em tudo, é egoísta, no momento em que vocês meninas falarem 'não quero mais', o que vocês acham que eles vão fazer?", perguntou.

O juiz falou ainda com os jovens sobre as agressões psicológicas que têm efeitos muitas vezes mais avassaladores na vida das mulheres do que a violência física. “A agressão psicológica que afronta a dignidade e autoestima provoca cicatrizes mais difíceis de serem curadas do que a agressão física”, explicou.

Os adolescentes e os filhos também sofrem as consequências da violência doméstica. Meninos e meninas se espelham no comportamento dos pais e podem se tornar agressivos ou ainda reagem às agressões com violência. O juiz citou casos de adolescentes que mataram pais que agrediram mães e de filhos que se tornaram adultos violentos e agressores, reproduzindo o comportamento dos pais.

Os jovens foram alertados sobre crimes de violência doméstica cometidos também por menores de idade em Serra Negra. Ele explicou que o Estatuto da Criança (ECA) protege os adolescentes, mas também pune em alguns casos, entre os quais o de violência doméstica. “Em Serra Negra temos um jovem de 17 anos que está respondendo por ato infracional em que a vítima é maior de idade”, salientou.

A importância da Lei 11.340, conhecida como Maria da Penha, foi destacada pelo juiz como um instrumento eficiente de proteção à mulher na maioria dos casos, não tínhamos instrumentos jurídicos para proteger a mulher como temos hoje. “A lei permite a prisão. Uma mulher vai para a delegacia de polícia e registra uma ocorrência contra marido, ex-marido, namorados e ex-namorados”, afirmou.



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