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Uma amiga ouviu outro dia de um dono de um bar muito conhecido na cidade que Serra Negra é um local privilegiado, especial. "Olha só quanta gente que está vindo aqui, estamos muito felizes", disse.
É verdade.
Serra Negra tem recebido milhares de visitantes nesta alta temporada.
Donos de bares, restaurantes, pizzarias, hotéis, pousadas e lojas estão rindo como há vários anos não riam.
A classe média brasileira certamente encolheu nestes anos de caos econômico, mas ainda é grande - e está de saco cheio da pandemia, está sem comprar roupas e calçados há três anos, está sem viajar, espairecer, se esquecer dos parentes e amigos mortos pela covid há igual tempo.
E muitos vieram, estão vindo e vão vir a Serra Negra para esquecer os dissabores da vida.
O prefeito faz coro à alegria dessa turma que concentra os negócios da cidade.
E tudo parece correr às mil maravilhas neste pedacinho de terra que alguns dizem estar longe, bem longe dos problemas do mundo - e obviamente, do Brasil.
Mas será que há tanto motivo para comemoração?
Da parte do 1% que concentra a riqueza da cidade, sem dúvida.
Do restante, nem tanto.
Por que, é bom perguntar, toda essa dinheirama que está entrando agora vai aumentar significativamente o número de empregos na cidade?
Vai aumentar a renda média dos trabalhadores?
Vai melhorar a vida de quem é empregado?
Vai tirar da miséria as centenas de famílias que sobrevivem às custas de doações cestas básicas - ou seja, da caridade?
A renda média dos habitantes de Serra Negra é de 1,7 salário mínimo mensal, a mais baixa entre as nove cidades do Circuito das Águas Paulista.
Só para se ter uma ideia, a renda média de quem mora em Jaguariúna é de 3,5 salários mínimos mensais, o dobro do que ganha o serrano.
Na pequenina Holambra, a renda média mensal é de 2,6 salários mínimos.
Os dados são do IBGE, de 2020.
O PIB (Produto Interno Bruto) per capita de Serra Negra é de R$ 25 mil. O de Jaguariúna, R$ 215 mil; o de Holambra, R$ 67 mil.
Os anúncios de emprego no Posto de Atendimento ao Trabalhador são de chorar. O último publicado, de 28 de junho, tinha 28 vagas, 27 delas de baixíssima remuneração, como ajudante de cozinha, auxiliar de escritório, cortador de lenha, paneleiro, faxineiro, caseiro de sítio, pedreiro, servente de obras... A exceção era o cargo de professor de inglês.
Dá para perceber que Serra Negra é o primo pobre da região.
E que, por mais que venham turistas, por mais que eles gastem por aqui, por mais que eles se encantem com as belezas da cidade, ela só vai se desenvolver - econômica, cultural e socialmente - se essa riqueza for distribuída entre seus moradores.
De nada adianta o bar estar cheio, a loja vender todo o seu estoque, o hotel tiver 100% de ocupação, se os seus funcionários continuam ganhando pouco, se as contratações forem apenas de temporários, sem carteira, sem direitos trabalhistas, se a prefeitura continuar a investir sem ouvir da população sobre o que ela realmente acha prioritário, se não parar de gastar em projetos que não são debatidos pelos principais interessados, os moradores da cidade.
Estamos todos muito felizes, não é mesmo?
Que tal, então, distribuir essa felicidade para todos?
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