//SERRA NEGRA NA RODA// Guerra na Ucrânia traz oportunidades para o Brasil, diz professor

 


Enquanto lideranças mundiais tentam negociar a paz, os ataques na Ucrânia prosseguem e o conflito deve se estender por mais algum tempo pela própria estratégia militar adotada pela Rússia, na opinião, do professor Héctor Saint-Pierre, titular da cadeira Segurança Internacional e Resolução de Conflitos e coordenador-executivo do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp.

“Acho que o conflito vai se estender um pouco mais. Vai ser uma guerra relativamente rápida, mas o relativamente rápido não é tão pouco. É uma guerra de cerco e de desgaste. Há lugares para serem bombardeados e para evitar mais mortes de civis e danos estruturais se cerca as cidades e se permite a saída dos civis”, explicou.

Saint-Pierre participou do programa Serra Negra na Roda, produzido pela Casa da Cultura e Cidadania Dalmo de Abreu Dallari, na quinta-feira, 17 de março. ”É uma guerra que vai levar tempo e não é que a guerra seja uma coisa e a diplomacia seja outra. A guerra é política. O campo de batalha é para melhorar as negociações e as negociações para melhorar as condições no campo de batalha”, disse.

A estratégia bélica baseada no cerco das cidades também é desgastante para a Rússia, na avaliação do professor. “Não é só para evitar vítimas civis, mas para manter a infraestrutura da Ucrânia, porque a Rússia também depende da Ucrânia”, explicou.

Saint-Pierre lembrou ainda que se discutem alguns pontos de um eventual acordo, mas há temas essenciais para a Rússia, assim como outros são importantes para a Ucrânia. “Portanto, é muito difícil chegar a esses acordos”, concluiu.  Ele avalia, no entanto, que o resultado militar dessa guerra será a derrota da Ucrânia pela disparidade de forças e que o fim do conflito vai resultar num mundo diferente.

O professor explica que o objetivo da guerra é sacrificar a Ucrânia para sangrar a Rússia, isolar a China e tentar recuperar o espaço perdido pelos Estados Unidos, que, segundo ele, é uma potência decadente.

Saint Pierre comentou ainda sobre o papel da imprensa e a empatia da sociedade às vítimas do conflito. “Não estou justificando a morte de nenhum refugiado, muito pelo contrário. Estou me referindo à hipocrisia da sociedade internacional e a hipocrisia da imprensa corporativa, que aponta apenas um lado da coisa”, disse.

O professor citou dados da Organização das Nações Unidas (ONU), segundo os quais, morre uma criança a cada 9 horas devido às crises humanitárias. “Isso a imprensa não mostra”, salientou. Corpos negros famintos ou massacrados por conflitos, ressalta o professor, comovem menos do que refugiados brancos cruzando as fronteiras. 

“Toda guerra de defesa é legítima e toda a guerra de agressão é ilegítima. É condenável a atitude de Putin nessa guerra, não tem justificativa, como não tem justificativa a invasão do Iraque, do Afeganistão e tantas invasões que há pelo mundo e que a imprensa não publica”, afirmou.

Saint-Pierre avalia que o papel do jornalista é oferecer subsídios para que as pessoas possam tomar suas próprias posições. “A imprensa tem de informar para eu tomar uma opinião, para eu tomar uma posição mais clara possível. Nesse campo de batalha, os Estados Unidos já são vitoriosos”, avaliou.

Mas a opinião pública, ressaltou, pode mudar com as consequências da guerra. "Toda essa sociedade que está na rua levantando a bandeira da Ucrânia vai sentir o preço das migrações de ucranianos na Europa, o peso da inflação, porque isso vai ocorrer”, afirmou. “Aquele que está levantando a bandeira da Ucrânia, amanhã vai estar chorando na fila do supermercado.”

O fim desse conflito vai desenhar um novo mundo, que já está descrito no documento recentemente assinado entre China e Rússia, explicou, em que há mais equidade entre os países. “É importante ler esse documento que prega a multilateralidade e a cooperatividade entre as nações”, afirmou.

O Brasil, na sua opinião, deve aproveitar a janela de oportunidades que o fim dessa guerra configurará. “Esse é momento de recuperar a cooperação que tínhamos na América do Sul, produtiva e estratégica em defesa, e aproveitar essa conjuntura de disputa de hegemonias para aproveitar esse cenário de crises como uma janela de oportunidades, procurando um posicionamento de não alinhamento pragmático, ou seja, não precisa se alinhar nem com um nem com outro”, concluiu.

A seguir a íntegra do programa:



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