//OPINIÃO// A melhor maneira de desagradar a todos

Carlos Motta

"O Decreto Municipal nº 5.234 estabelece novas medidas de enfrentamento da pandemia, decorrente do novo coronavírus, com redução do funcionamento das atividades comerciais, empresariais e correlatas no âmbito municipal a partir de segunda-feira, 14 de junho. Confira a íntegra do decreto: https://bityli.com/imQeM"

Foi dessa maneira sucinta e lacônica que a Prefeitura de Serra Negra informou à população, em sua página do Facebook, a medida mais grave tomada na cidade desde o início da pandemia da covid-19: o fechamento quase completo das atividades comerciais e de serviços por dez dias. 

A repercussão da medida, porém, foi inversamente proporcional à quase invisível divulgação oficial: na manhã deste sábado, 12 de junho, a nota da prefeitura havia merecido mais de 130 comentários de serranos, a maioria com severas críticas ao prefeito Elmir Chedid.

"Esse decreto não resolve nada , ou vc tenha capacidade de fechar tudo na cidade ou vc deixa tudo aberto …", disse um internauta.

"Voltou a palhaçada do abre e fecha", completou outro.

"Põe casaco, tira casaco, põe casaco, tira casaco...", brincou um terceiro.

"Esse tipo de decreto deveria vir com o mínimo de 7 dias de antecedência... Assim as pessoas poderiam se organizar melhor...", ressaltou outro serrano.

O tom dos exemplos acima se repetiu dezenas de vezes, como prova de que a comunidade já perdeu a paciência com a pandemia, com as medidas erráticas até agora tomadas, e com uma administração municipal que está ainda em seu início.

Como afirmou o médico sanitarista Antonio Luiz Caldas Júnior, no programa Serra Negra na Roda transmitido na quinta-feira, 10 de junho, o controle da pandemia em regiões turísticas tem se mostrado mais difícil do que em outras nesta pandemia. 

Países como Espanha e Cuba, muito visitados por estrangeiros, em certo momento acreditaram que o pior tinha passado, abriram as fronteiras, e se viram novamente em uma situação preocupante.

O coronavírus circula entre as pessoas por meio delas próprias. Ele não vai de um lugar a outro sozinho: é preciso que um hospedeiro, no caso o ser humano, o carregue.

Explicado isso, não se entende por que o prefeito Elmir Chedid abriu a cidade para os turistas, no feriadão de Corpus Christi, mesmo sabendo que Serra Negra está no pior momento da pandemia, com uma média diária de 21,5 casos, três mortes em 11 dias do mês e hospitais da região colapsados. 

Bem, a gente sabe que ele provavelmente fez isso para aliviar o caixa dos comerciantes, donos de bares e restaurantes e hoteleiros locais, que vêm há mais de um ano pressionando pela abertura completa e irrestrita de suas atividades.

De certa forma, o prefeito tenta se equilibrar na equação saúde pública/economia - um falso dilema, se gastarmos alguns segundos para pensar.

Isso porque, é óbvio, a condição sine qua non para existir economia é existir vida.

Fora essa obviedade, nesta situação de guerra que o país vive - não, o inimigo desta vez não é o "comunismo", mas esse novo coronavírus -, o papel do Estado é amparar, de todas as formas, os cidadãos. Entre outras coisas, é para isso que o Estado existe.

E esse amparar implica ajudar todos indistintamente, com o dinheiro dos impostos recolhido da sociedade, enquanto a guerra contra a covid-19 não for vencida.

O trabalhador precisa comer? 

O Estado deve garantir a comida.

O empresário precisa pagar suas contas? 

O Estado deve garantir isso a ele.

Parece simples - e é.

Só um governo alheio às suas funções, despreparado e incompetente, no melhor dos casos, mal intencionado e genocida, no pior, desconhece esses fatos básicos.

No caso de Serra Negra, não seria justo atribuir a uma administração ainda nova toda a responsabilidade pela tragédia que se anuncia. 

Mas também não cabe isentá-la de ser responsável em parte por esse cenário. 

Um administrador público é eleito para governar, ou seja, tomar as melhores decisões visando o bem comum.

E ao fazer isso dificilmente vai contentar a todos, ao menos de imediato.

Infelizmente, ao tomar tardiamente uma medida que pode ter algum efeito para ajudar a diminuir a crise sanitária, o prefeito parece ter desagradado à maioria das pessoas que se preocupam com seu bem-estar e dos empresários que querem manter seus negócios abertos.

Estar entre dois fogos não é certamente o que a administração municipal desejava.

Mas esse é o preço que ela paga por ter desconsiderado os sinais emitidos pelo coronavírus desde que aportou à terra brasileira há mais de um ano, de que é um inimigo cruel, insidioso e que, portanto, tem de ser combatido com toda a energia e coragem possíveis.

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