//ANÁLISE// As falácias no combate aos efeitos da crise


Fernando Pesciotta

O governo de Jair Bolsonaro não mede esforços para comprovar seu amplo descaso com o combate à pandemia do coronavírus e seus efeitos. O cardápio é vasto, vai da tentativa de esconder e embaralhar o número de vítimas à total falta de empenho para evitar o terrível desastre na economia e, consequentemente, para o trabalhador.

A tão propagada oferta de crédito para que as empresas tivessem fôlego para ultrapassar a tormenta é notícia nos jornais especializados em economia todos os dias, mas até agora praticamente nenhum centavo foi liberado pelos bancos. 

Em um de seus delirantes pronunciamentos em rede de TV o presidente festejou o acordo que envolvia Banco Central, Ministério da Economia e Febraban, a federação dos bancos – a entidade chegou a publicar anúncios de página inteira nos jornais de expressão nacional propalando a iniciativa. Até agora, porém, o programa não passa de propaganda enganosa.

Como alternativa econômica, o governo tomou a iniciativa de propor uma lei que permitisse o corte de jornada de trabalho e de salário. Teve seu pedido atendido pelo Congresso, mas o efeito prático da medida parece nulo. Sem nenhuma sinalização de coesão, de respaldo, de garantia de que o País vai superar a crise, os empresários estão demitindo.

Segundo relato da Folha neste domingo, a demissão ocorre em todos os setores da economia.

Tudo indica que sem um planejamento como aquele feito pelos países europeus, por exemplo, o Brasil terá um segundo semestre como um longo e torturante túnel, cuja luz no seu final não passa de uma pequena chama pronta pra ser assoprada por Bolsonaro, que não preservou vidas nem a economia.

Protestos

O cenário macro se junta à instabilidade política. A julgar pelo tamanho das manifestações de rua realizadas neste domingo, em plena pandemia e ainda com a necessidade de isolamento social, os problemas do governo tendem a aumentar. Foram observados também buzinaços e panelaços ao longo da tarde em várias cidades.

Analistas são praticamente unânimes na avaliação de que Bolsonaro passa por um processo de desidratação. Com menos de 18 meses de governo, o presidente vê nas várias frentes de oposição o avanço da sensação de crise política.

Segundo conclusão do Foro de Teresina, podcast semanal da revista Piauí, a resistência de militares da ativa em entrar numa aventura bolsonarista está fazendo o presidente buscar uma união de força com as PMs e uma milícia armada. Daí as várias revelações de que Bolsonaro pretende armar a população, moldado no modelo ucraniano.

Isolamento

Na semana passada, economistas citavam a decisão da China de cortar a compra de soja dos EUA como uma das razões para o otimismo que tomou conta do mercado financeiro. A conclusão é de que o agronegócio brasileiro ganharia com isso. Ontem, a agência Bloomberg informou que a China ampliou a compra de soja do Brasil, aproveitando o preço baixo proporcionado pela desvalorização do real.

Mas é com a Argentina que a China indica um futuro mais promissor, a ponto de tirar do Brasil o título de maior parceiro comercial do país vizinho. Os chineses elevaram em mais de 50% a compra de soja e carne bovina e as vendas brasileiras para a Argentina despencam.

O alinhamento ideológico com os EUA de Donald Trump está trazendo enormes prejuízos para a economia. Enquanto o presidente norte-americano desdenha de Bolsonaro e cita o Brasil como péssimo exemplo, o Itamaraty não se cansa da subserviência. Na semana passada, revela a Folha, foi o único país a emitir nota de apoio à Casa Branca em meio aos protestos contra a morte de George Floyd. Com o risco crescente de um fracasso de Trump nas eleições de novembro, Bolsonaro corre para ficar com a brocha na mão.

Fernando Pesciotta é jornalista e consultor em comunicação. Contato: fernandopaulopesciotta@gmail.com

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