//EDUCAÇÃO// Professores aprovam adiamento do Enem

Data do exame será definida em consulta aos alunos  (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Salete Silva

Professores do ensino médio da região aprovaram o adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Alguns defendem até seu cancelamento.

O adiamento do Enem por um período de 30 a 60 dias ao previsto nos editais, foi anunciado nesta quarta-feira, 20 de maio, pelo Instituto Nacional de Estudos Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

O Inep deverá promover, no mês de junho, entre os inscritos do Enem 2020, uma enquete para definir a nova data, por meio da Página do Participante. As inscrições para o exame seguem abertas até as 23h59 desta sexta-feira, 22 de maio.

Conforme vinham demonstrando as reportagens da série sobre educação publicadas pelo Viva! Serra Negra, ao longo desta semana, os candidatos a uma vaga à universidade das faixas de renda mais baixas e que têm encontrado mais dificuldades com o ensino à distância (EAD), seriam, segundo os professores, os maiores prejudicados se a data do Enem fosse mantida. 

Piassa: "Tenho alunos que moram em locais sem
 internet e alguns que nem possuem celulares"

“Existem realidades completamente diferentes nas aulas de ensino à distância (EAD)”, diz o professor serrano de história do ensino médio da  Escola Estadual Luiz Leite, em Amparo, Paulo Roberto Schiavo Piassa.  

Em algumas escolas, em especial particulares, as aulas no sistema EAD, na avaliação do professor, vêm ocorrendo de forma geral de maneira satisfatória. No Estado, porém, a situação, ele observa, é diferente.

“Embora as equipes gestoras de cada instituição estejam se desdobrando quanto ao conteúdo e como ele deve chegar aos alunos, a clientela do Estado representa uma gama enorme de alunos com realidades completamente diferentes”, explica.

Alguns de seus alunos, Piassa relata, moram em regiões onde o sinal de internet não chega. Há outros que não têm celular e outros ainda que o celular não comporta as plataformas e programas necessários para o ensino à distância, revela.

“Essa realidade distópica que enfrentamos, que era minimizada na escola presencial, com a inclusão do café da manhã e da merenda, as únicas refeições do dia, acredite, aqui na nossa região é uma realidade que dói”, afirma o professor.  

A escola presencial de certa forma, Piassa avalia, nivela todos às mesmas condições de acesso à informação e ao conteúdo. “A escola virtual é excludente”, compara.

O professor fez críticas ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, que defende, de forma pioneira, realizar o Enem em data que se cruza com os principais vestibulares do país, como o da Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade de Campinas (Unicamp) e que cogitou até em realizar o exame de forma virtual.

“Isso é terrível, primeiro pela falta de acesso de todos os estudantes às mídias sociais. E segundo, pela seguridade e lisura do vestibular em relação a onde e como será fiscalizada a forma de realização da prova por um aluno”, afirma.

O professor questiona como seria, por exemplo, a fiscalização para evitar que um candidato receba "ajuda" de especialistas no assunto durante a realização da prova remota, em uma carreira extremante concorrida, como medicina, e algumas áreas da engenharia.

O professor defende não só o adiamento do Enem, mas também seu cancelamento. “Algumas universidades federais realizam vestibulares semestrais”, lembra Piassa. “Não seria o caso de se pensar nisso?”, pergunta. Para ele, o mais acertado seria o cancelamento, como algumas instituições de renome do mundo já fizeram.

Marcurio: alunos estavam preocupados
com a manutenção da data do Enem

Para o professor de filosofia da rede estadual Claudinei Marcurio Junior, manter a data do Enem seria ferir o direito à universalização da educação previsto na Constituição, assim como na declaração universal dos direitos do homem.

“O Enem é uma das mais importantes ferramentas de acesso ao ensino superior para alunos da rede pública, a partir de programas como o Sisu e o ProUni, e do acesso às principais universidades públicas de nosso país, a partir de sua nota", diz. "E o acesso à educação é importante instrumento de transformação social.”

Além disso, o Enem, na sua avaliação, é relevante para que os alunos em situação de vulnerabilidade social tenham uma melhora em sua condição social e humana a partir da criação de novas perspectivas proporcionadas pelo acesso ao saber.

O professor relata que muitos de seus alunos demonstravam preocupação com a manutenção da data do Enem e as aulas de ensino à distância, que limitam as condições de acesso de parte deles aos conteúdos necessários para obter um bom resultado no exame.

“As aulas à distância, a partir de ensino remoto por meio de canais de televisão e internet atendem apenas cerca de 30% dos alunos de toda a rede, enquanto os demais se encontram excluídos do processo de aprendizagem, pois muitos só possuem acesso a esses meios por intermédio da escola, com o auxílio de seus professores, até mesmo para realizar as inscrições em provas como Enem”, relata o professor.

Essa situação precária e vulnerável de parte dos estudantes, conclui, torna inviável a manutenção da data da prova, o que acentuaria ainda mais as desigualdades já existentes entre alunos das redes públicas e privadas de ensino.

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