//OPINIÃO// Economia e saúde entrelaçadas


Salete Silva

A Prefeitura de Serra Negra vem afrouxando as regras de isolamento social, em especial por pressão de vereadores e parte de comerciantes.

O argumento dos que reivindicam o início da flexibilização da quarentena em geral é que as medidas para garantir a capacidade de atendimento hospitalar estão provocando a falência de empresas serranas e tirando a renda de trabalhadores.

Essa polêmica divide também a população e provoca um debate acirrado e sem sentido sobre se o mais importante é salvar vidas ou a economia.

As discussões acaloradas, no entanto, desconsideram a característica básica desta situação inédita no país e no mundo: a economia e a saúde estão entrelaçadas e não é possível separá-las.

Ao contrário de todas as crises econômicas e financeiras vividas ao longo de décadas pelos brasileiros, a causa desta vez não vem do sistema capitalista nem do sistema político nem muito menos de equívocos cometidos por governos anteriores.


A causa é uma pandemia como não se tinha há mais de 100 anos e cujo único remédio com eficácia comprovada até agora para salvar vidas é o isolamento social.

Se a causa é a saúde, a economia não encontrará um caminho viável para a recuperação se não tomar as medidas necessárias para garantir a saúde das pessoas.

Essa situação é agravada pelo comportamento do presidente da República Jair Bolsonaro (sem Partido) e de suas equipes, em especial da área econômica, que demoraram muito para compreender que não dá para traçar cenários econômicos e adotar medidas para evitar os efeitos da pandemia nos negócios sem entendimento do que há por trás da doença.

Para isso, é preciso que as autoridades econômicas pela primeira vez se guiem não apenas por dados e teorias econômicas. As políticas econômicas carecem de um olhar multidisciplinar, exatamente como ocorre em outras áreas, como a psicopedagogia, que não caminha sem o olhar da área da saúde, da psicologia, da terapia ocupacional e da fonoaudiologia, entre outras.

A economia precisa conversar com a saúde. As autoridades municipais, incluindo os vereadores que pressionam por medidas econômicas em especial para atender o clamor de seu eleitorado, precisam estar atentos aos artigos científicos e ao que dizem infectologistas, biólogos e médicos para que possam criar medidas econômicas sustentáveis.


Não há sinais claros para o pessoal da saúde que já é seguro tornar as regras de isolamento social flexíveis. E isso significa que se adotar medidas sem considerar essa constatação pode até ser que o impacto agora na economia seja amenizado, mas a recessão pode ser muito maior daqui alguns meses se a saída da quarentena não for planejada e organizada.

Essa é a concepção de economistas, alguns dos quais admitem ter demorado para perceber esse entrelaçamento entre a economia e a saúde. Relaxar a quarentena agora sem a devida segurança pode fazer com que a retomada seja ainda mais lenta quando a pandemia passar.

Exigir das autoridades econômicas e do governo federal maior atenção aos trabalhadores de menor renda e às pequenas e microempresas faz mais sentido do que a discussão sobre salvar vidas ou empresas.

Medidas que reduzem os salários dos trabalhadores só retiram renda da economia. Além disso o auxílio emergencial de R$ 600 é insuficiente em valores e prazos para manter as famílias mais vulneráveis.

Além disso, o governo demorou muito para criar linhas de crédito para os pequenos e microempresários, o que já deveria ter ocorrido no início da pandemia. 


Só na segunda-feira passada, 20 de abril, a Caixa Econômica Federal e o Sebrae anunciaram uma parceria para oferecer R$ 7,5 bilhões em crédito para microempreendedores individuais (MEI), micro e pequenas empresas.

Os empreendedores contarão com uma carência de 9 a 12 meses, pagamento entre 24 e 36 meses, com taxas de juros 40% menores. 

Os valores estimulados para o crédito são de até R$ 12,5 mil para MEI, até R$ 75 mil para microempresas e até R$ 125 mil para empresas de pequeno porte. 

Os juros são de 1,59% ao mês para MEI, 1,39% ao mês para microempresas e 1,19% ao mês para pequenas empresas.

Se em vez de perder tempo criticando as medidas necessárias de isolamento social, o governo Bolsonaro tivesse cobrado maior agilidade de sua equipe econômica para que essas linhas de crédito estivessem disponíveis logo após o início da quarentena, haveria uma luz no fundo do túnel  para evitar o fechamento de lojas em Serra Negra, já anunciado por comerciantes.

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