//ENTREVISTA// Magaldi, entre a política e a medicina (1)

Rodrigo Magaldi: "Nunca emiti uma receita para um paciente que eu não conheça"

Salete Silva e Carlos Motta

O médico Rodrigo Magaldi não é um vice-prefeito tradicional, daqueles que pouco aparecem em público, decorativos, por assim dizer. Ao contrário, ele é visto em quase todas as ações externas da Prefeitura de Serra Negra, seja ao lado do prefeito Sidney Ferraresso (DEM), seja sozinho, representando o Executivo. 

Magaldi, que está na cidade desde 2004, tem outra característica que o diferencia como vice-prefeito: ele trabalha como médico da rede pública de saúde, atendendo atualmente no posto da Nova Serra Negra. E por causa disso foi alvo, recentemente, de uma polêmica, já que o Ministério Público recomendou que ele se afastasse do seu trabalho.

Nesta entrevista ao Viva! Serra Negra, a primeira parte de uma série de três, Magaldi explica por que não seguiu essa recomendação, rebate as acusações de que prestou um número exagerado de atendimentos - denúncia levada ao Ministério Público -, e fala sobre outra polêmica em que esteve envolvido este ano e que resultou na exoneração de Bárbara Regiani, sua companheira, do cargo de secretária de Saúde do município.

"Com todo o respeito não posso me afastar das minhas atividades médicas. E a minha responsabilidade? E os pacientes crônicos, minha paciente que está usando oxigênio em casa, que não consegue passar em outro médico? Não temos pneumologista na rede. Sabe quanto vai custar seis médicos para fazer o que faço? R$ 150 mil por mês", diz num trecho da entrevista, que tem sua primeira parte publicada em seguida: 


Viva! Serra Negra - Você continua com o seu trabalho de médico da rede pública de saúde de Serra Negra, apesar da recomendação do Ministério Público para que se afastasse?
Rodrigo Magaldi – Continuo. Na verdade, eu sou médico. Digo isso com alguma frequência, que eu não estou médico, estou político. Nós somos em cinco irmãos médicos e eu vim para cá em 2004, o hospital [Santa Rosa de Lima] estava fechado e a gente o reabriu. Então, praticamente há 16 anos a gente está fazendo atendimento público. A gente atende na Nova Serra Negra, nos bairros, hoje estou atendendo estritamente na Nova Serra Negra. Mas a gente atende em todos os bairros. Nas Três Barras, na Firmino, faço visitas domiciliares, no Refúgio, enfim, nos postos onde não tinham médicos a gente ia atender. Nos postos onde a gente já atendia, a gente continua atendendo. O Ministério Público não fez uma recomendação de que a gente não parasse com a medicina. A recomendação do Ministério Púbico é para que eu não tivesse nenhum contrato com a prefeitura. Agradeço essa oportunidade de a gente poder esclarecer isso de uma vez por todas. Eu não tenho contrato algum com a prefeitura. Não sou funcionário público. A medicina que presto, a despeito de ser nos postos, presto para uma empresa privada, da qual também não sou sócio. Essa empresa presta serviços ao Conisca, que é o consórcio, que serve às cinco cidades da região. É o Conisca, sim, que faz o acordo com a prefeitura. Então, alguns dizem que o cofre é único. Não, eu presto serviço especificamente para uma empresa privada. A gente entende que não existe um vínculo empregatício e não existe mesmo. Não sou funcionário, como não sou funcionário da prefeitura. Até 2008 fui realmente funcionário da prefeitura. De lá para cá, há mais de dez anos, portanto, antes da eleição, antes da política, não tinha mais nenhum tipo de vínculo. Continuo atendendo, voltei a atender no posto da Nova Serra Negra, às terças, quartas e quintas. Só não atendo, não atendi, no período em que estava como prefeito. Achei melhor fazer o afastamento e não fazer o atendimento nesse período. No ano passado, por 15 dias, e este ano novamente, por cerca de 20 dias, ficamos afastados da medicina, sonhando com a medicina, mas afastados.

Viva! Serra Negra – Com relação às consultas médicas realizadas, você não faz muitas consultas num período muito curto de tempo?
Rodrigo Magaldi – A informação está errada. Foi informado que atendi 104 consultas em duas horas, o que não é verdade. Foram encaminhados ao Ministério Público todos os relatórios, atendimentos, foram encaminhadas as planilhas de atendimento, e tem lá todas as datas. Não faço a planilha. A planilha não é minha. Quem faz a planilha é o funcionário que fica lá no posto. Teve um dia em que foram realizados 99 atendimentos em três horas e meia, e realmente é um número muito grande. Mas havia ficado sem atendimento por bastante tempo. Tinha ficado dois ou três dias sem atendimento. Se vocês acompanharem, faço convite a vocês, a todos, ao Ministério Público, aos vereadores que vão lá no Nova Serra Negra ver o volume de pessoas atendidas. Faço atendimento de pediatria, de pneumologia, faço atendimento de clínica médica. Realmente, a gente atende um volume muito grande. Também não me contento com esse número aumentado de pessoas. Mas em cinco anos de atendimento, em dois ou três dias tem um número grande. O restante são 25, 30, 40, uma média de 40.

Viva! Serra Negra – Mas ainda assim é alto, não?
Rodrigo Magaldi -  Para se atender em três horas, não. É muito variável.

Viva! Serra Negra – Quantas consultas dá por minuto? 
Rodrigo Magaldi – É muito variável. Se você chegar aqui e pedir uma receita porque já faz um acompanhamento, não preciso te examinar especificamente e eu já estou fazendo um atendimento. É facultado isso, inclusive no CRM [Conselho Regional de Medicina]. Vou fazer a receita e lhe entregar. Quanto tempo vou demorar?


"Se você for no posto da Nova Serra Negra,
verá que a nossa aceitação, em pesquisa, é de
91%, a maior do Brasil, não de Serra Negra!"


Viva! Serra Negra – São pacientes que você já conhece?
Rodrigo Magaldi – Todos. Nunca emiti uma receita para um paciente que eu não conheça. Todos os pacientes, incluindo esses da planilha... se chamar esses 99 desse dia, tenho certeza de que todos vão confirmar o atendimento. A grande maioria faz uso de medicamento prolongado e a gente não pode cessar o medicamento, porque senão a pessoa surta, principalmente receituário azul, controlado. A gente não pode deixar essa pessoa desassistida. Eu deveria reclamar pelo número de atendimento, mas a gente deveria mandar uma diligência, ver se as pessoas estão sendo atendidas e como são atendidas. Estou há 16 anos em Serra Negra e pelo que saiba não tive nenhuma queixa sequer de atendimento. 

Viva! Serra Negra – Todos os pacientes são agendados?
Rodrigo Magaldi – Tenho uma agenda grande e tenho os encaixes. 

Viva! Serra Negra – Desses 99, metade é encaixe?
Rodrigo Magaldi – Volto a repetir, como fiquei vários dias sem atendimento, quando retornei é óbvio que muita gente nos procura. Tinha um número grande de atendimentos fixos, marcados, e outro número grande de atendimentos que foram prestados. A checagem disso é muito fácil. É só ir ao Ministério Público, o vereador queixoso ou qualquer pessoa, ir lá e perguntar para esses pacientes se efetuei esse tipo de atendimento. É muito simples, muito tranquilo.

Viva! Serra Negra – Você consegue quantificar o número de pacientes que você tem em Serra Negra?
Rodrigo Magaldi – Tenho mais de 200 mil atendimentos em Serra Negra nesses 16 anos. O Ministério Público, inclusive, solicitou os atendimentos no hospital. No meu dia de plantão, teve dias em que atendi 211 pessoas. Tem quem vai procurar a gente, muitas vezes volta, por conta de um atestado médico, que é algo mais simples, um preenchimento de medicamento, que é algo mais simples, os relatórios de perícia médica, porque fui perito médico por muito tempo, um receituário, um medicamento... Se você me pede um Captopril, que precisa tomar senão você tem hipertensão, vou escrever o seu nome, escrever Captopril, perguntar o tempo que você usa e isso dá menos de um minuto. Os atendimentos diferenciados que a gente tem de fazer, uma consulta médica, são fixos. Então, se você for no posto da Nova Serra Negra, verá que a nossa aceitação em pesquisa é 91%. É a maior do Brasil, não de Serra Negra! Se for no posto das Três Barras, onde também estava atendendo, a gente recebeu, não é nossa pesquisa, nem pesquisa política, é o PMAQ (Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica), o governo mandou a liberação dizendo que o nosso posto é o melhor da região, o das Três Barras, um posto simples, que não tem uma estrutura física diferenciada. Qual é a diferença que ocorreu ali? A estrutura humana, o atendimento, que melhorou bastante. 

Viva! Serra Negra – Como são os índices de Serra Negra
Rodrigo Magaldi – Os índices de Serra Negra em saúde estão entre os melhores do Estado. O melhor em odontologia do Estado. Foi um título recebido do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo. Temos zero de mortalidade infantil. Só isso, só por zero de mortalidade infantil já estou descansado com relação ao meu trabalho. 

Viva! Serra Negra – Então, essas denúncias, na sua opinião, são de cunho político? 
Rodrigo Magaldi – Claro, não tenho dúvida nenhuma. É simples, estou há 16 anos aqui. E não acho que é véspera de eleição. Não estamos em véspera de eleição. Eleição é só final do ano que vem e tem muita água para rolar. Agora, é claro que são de cunho político. Partiu de quem? De vereadores de oposição que estão tentando levantar alguma coisa há muito tempo. Agora, estou há 16 anos trabalhando, por que não reclamou antes que eu atendia um volume grande? Por que antes não se queixou que eu atendia muita gente?  Teve queixa de paciente? Não vi queixa de paciente. Meu paciente é meu patrão. Ele pode reclamar.

Viva! Serra Negra – E o afastamento da Bárbara Regiani de Oliveira, sua companheira, da Secretaria de Saúde? 
Rodrigo Magaldi – Então, veja como são as coisas, é a Súmula 13 [da nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau], como você sabe, cargo político, ela tinha direito de continuar. Os dados de saúde, isso não aconteceu da noite para o dia, foi trabalho, trabalho da Bárbara, trabalho da Secretaria de Saúde e da Bárbara, melhorou muito, tem que melhorar mais ainda, acho que a Teresa Cristina, que é agora a atual secretária, tem de melhorar muito mais, e quem vier depois e depois. A nossa luta sempre é pela área da saúde. Agora, embasado em que ela era minha patroa e eu patrão dela, quem entrar por essa óptica, claro, qualquer um, secretário de saúde ou secretária, vai ser meu patrão e eu vou ser patrão dele. Não vai mudar nada. A Bárbara nunca fez uma planilha, ao contrário, volto a dizer, as planilhas não são feitas pelo médico, não posso atender lá e colocar o nome da pessoa. A planilha me vem pronta. Eu assino. A planilha verdadeira está na mão do promotor, com o número de atendimentos, com as datas, os horários, tudo direitinho. Vamos discutir? Vamos discutir. Não há problema algum. A gente achou melhor, para não dar um desgaste, o afastamento da Bárbara, agora o meu afastamento, como médico, enquanto médico, não.

Viva! Serra Negra – Isso não tem consequências com o Ministério Público, se você continuar?
Rodrigo Magaldi – Não sei se existem consequências ruins. Eu volto a dizer, nossa preocupação tem de ser com o Ministério Público, que eu respeito muito, o dr. Leonardo, que é espetacular. Aliás, o Judiciário da nossa cidade vai na contramão do país... Com todo o respeito não posso me afastar das minhas atividades médicas. E a minha responsabilidade? E os pacientes crônicos, minha paciente que está usando oxigênio em casa, que não consegue passar em outro médico? Não temos pneumologista na rede. Sabe quanto vai custar seis médicos para fazer o que faço? R$ 150 mil por mês. Teve mês que recebemos uma quantidade importante. Todos os médicos, todos contratados em Serra Negra recebem por consulta. Só tem dois concursados no Conisca, e o restante todos recebem por consulta. Sabe quanto pagam por consulta? R$ 32,00. Com os descontos, não posso mais receber como pessoa física por causa da política, tenho desconto porque a empresa recebe, paga o imposto dela, a consulta vem para mim com o desconto do imposto e vem ainda 27,5% de imposto meu e não recebo nem férias, nem décimo terceiro, não tenho vínculo trabalhista.

Viva! Serra Negra – Não é esse baixo valor pago pelas consultas que faz com que os médicos atendam rapidamente para ganhar na quantidade?
Rodrigo Magaldi – Sim, a medicina nesse aspecto está depauperada. Se fizer comparação com consulta particular, não sai por menos de R$ 400 ou R$ 500 uma consulta. Quem da população pode? A gente atende quem não pode, quem precisa. A gente atende o povo. Faço questão de dizer isso sempre. Estou aqui há 16 anos, podia muito bem estar com clínica particular, tranquilo, atendendo quatro pessoas. É essa a ideia? Atender cinco por período, a R$ 500? Só que minha opção, de meus irmãos, do meu pai falecido, é atender ao público. Somos em cinco irmãos médicos. Vim abrir um hospital que estava fechado, em que não nascia mais nenhum serrano. Vim aqui, e eu e meus irmãos só atendemos em rede pública, temos essa filosofia.

Comentários