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Carlos Motta
Nos tempos da Jundiaí da minha juventude os civis batiam continência para os militares. Afinal, eram eles que mandavam em tudo. Décadas depois, um capitão que progrediu na vida se tornando civil chegou ao mais alto cargo da República, a Presidência, com um discurso saudosista dos anos em que a farda verde-oliva era temida pela maioria e reverenciada por outros tantos.
O capitão trouxe ao seu governo, além de uma tropa de oficiais de patente superior à sua, anos de discursos pretensamente moralistas, cívicos e patrióticos. Uma parcela da sociedade brasileira, de boa fé, louva suas mensagens como dignas de um enviado divino. Outros seguidores viram que esse incontrolável tatibitati seria uma ótima oportunidade para pôr em prática uma das únicas leis que o brasileiro segue fielmente, a de Gerson, aquela que diz que o importante é levar vantagem em tudo.
É mais que evidente que o país vive, em meio a uma grave crise econômica, uma volta ao passado, como se a ressurreição de carcomidos símbolos fosse afastar o povo brasileiro do precipício cada vez mais próximo a que ele, conscientemente, procurou se atirar.
Nossos políticos não prestam? Chamem os militares.
Nossos empresários são péssimos administradores? Ponham os militares em seu lugar.
Nossa polícia é incapaz de reprimir o crime? Convoquem os militares.
Nossos professores não ensinam à juventude valores suficientes para levá-la ao sucesso e à felicidade? Ora, simples, deixem a educação para os militares.
A sensação é que a Jundiaí da minha juventude, aquela que comemorava com um feriado o 31 de março, saiu da máquina do tempo.
Dias atrás, nesta pequena Serra Negra, tivemos um claro exemplo de como não só esse deja vu está cada vez mais forte, como também a Lei de Gerson ainda persiste incólume e sobranceira sobre todas as outras: fato incomum, as escolas públicas da cidade foram invadidas por representantes de um tal "instituto militar", convidando os jovens para uma prova preparatória a uma carreira - adivinhem onde? - nas Forças Armadas. E com promessas de salários mais que tentadores para estes dias de desalento.
Cerca de 150 jovens atenderam a essa convocação. Fizeram uma prova, passaram no teste, seus pais devem ter sido contatados - ou vão ser brevemente - para a próxima etapa do processo: matricular seus filhos nesse curso que os preparará para prestar exames que os levarão a uma vida segura. Por módicos R$ 150 mensais - por um ano!
Está certo que a educação brasileira não é lá essas coisas. Está certo que esse bizarro capitalismo que vivemos enfatize o "empreendedorismo" sob todas as suas formas - as mais selvagens, brutais e toscas, inclusive.
Mas tudo tem limite. Diretores abrirem as portas de suas escolas - públicas, mantidas com o nosso suado dinheirinho, é bom frisar - para uma publicidade tão pueril e enganadora como essa é demais.
Nossos jovens merecem mais respeito. Assim como as Forças Armadas, uma instituição que por mais críticas que se façam a ela, não deveria ser usada e enxovalhada dessa maneira.
Carlos Motta
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