//SALETE SILVA// As bicicletas, o povo e os donos da cidade

 



Nos últimos meses passei a alternar a corrida de rua e o ciclismo. Constatei o que os ciclistas provavelmente devem ter observado há muito tempo: pedalar pelas ruas da cidade é para os corajosos e os jovens.

Serra Negra não é uma cidade amiga dos ciclistas. A ausência de faixa exclusiva para bicicletas ou de ciclovias, além da falta de respeito no trânsito, dificulta a convivência harmoniosa entre motoristas, motociclistas e ciclistas.

As ruas centrais, por serem mais planas, são as preferidas dos ciclistas. Mas são estreitas e nos horários de pico com veículos estacionados dos dois lados se tornam ainda mais apertadas.

Os jovens arriscam manobras perigosas para desviar de carros, e em especial, de  caminhões. Mas falta a mesma desenvoltura aos ciclistas menos habilidosos e aos mais velhos. Muitos acabam desistindo do ciclismo e outros nem se arriscam.

Serra Negra aprovou na administração municipal passada um Plano de Mobilidade Urbana. O documento prevê o estímulo ao ciclismo, seguindo a tendência mundial de sustentabilidade ambiental e como alternativa para desafogar o trânsito na área central. Mas não detalha como isso será feito nem como a ciclovia ou uma faixa exclusiva pode ser inserida na malha de trânsito.

Desenvolvido ao longo da pandemia de covid-19, o plano não foi amplamente discutido nem divulgado. As melhores soluções aparecem nos debates e a divulgação é essencial para mudar a mentalidade e convencer o cidadão a aderir à ideia de uma malha viária mais sustentável.

A substituição dos carros ocorreu em países desenvolvidos e democráticos, como a Dinamarca, onde mais de 60% das pessoas utilizam a bicicleta para fazer tudo, incluindo trabalhar e ir à escola.

Para promover mudança cultural e de mentalidade e realizar transformações fundamentais para a melhoria da qualidade de vida e modernização da cidade, a administração municipal tem de ser efetivamente popular. A decisão não pode ser exclusiva do Executivo.

A Praça Sesquicentenário, a maior da cidade e mais utilizada para a prática de caminhadas e corrida, está sendo revitalizada sem que o projeto tenha sido apresentado à população. A reclamação é dos próprios vereadores da base de apoio do prefeito Elmir Chedid na Câmara Municipal.

O investimento na revitalização não é pouco: R$ 3,5 milhões que podem ser elevados devido à inflação. Vai haver ciclovia? As calçadas vão estar adequadas para as caminhadas e corridas? Quem sabe? O Conselho Municipal de Turismo (Comtur) aprovou o investimento sem conhecer o projeto, como ocorreu com outras obras, como a réplica da Fontana di Trevi. 

A cidade é nossa, a praça é nossa, mas o sentimento de pertencimento e consciência cidadã só existe quando há participação popular. O que vem pronto não tem o mesmo valor nem força de transformação. A cidade é deles, que decidem tudo. Aos cidadãos resta aplaudir na cerimônia de inauguração e manifestar gratidão ao prefeito, governadores e deputados nas urnas.    

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Salete Silva é jornalista profissional (ex-Gazeta Mercantil e Estadão) e editora do Viva! Serra Negra   



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