//ASSISTÊNCIA SOCIAL// Aumenta número de sem-teto na cidade

Avenida Laudo Natel é novo ponto dos moradores de rua

Salete Silva

Há moradores de rua em todas as partes do mundo: São Paulo, Nova York, Finlândia e também em Serra Negra. O número de pessoas que vivem nas ruas tem crescido nos últimos anos em todos os lugares.

Suas histórias de vida são parecidas, seja na capital mais rica do Brasil, na maior cidade do mundo ou no país nórdico, onde o governo amenizou o problema oferecendo um apartamento para cada indigente.

“Não me fixo numa cidade, ando por vários lugares e agora estou em Serra Negra”, diz André Luís Coelho, de 25 anos, que se juntou a um grupo de moradores de rua, a maioria de serranos, que vagueia pela cidade.

André diz que é de Amparo e que desde junho do ano passado está em Serra Negra, onde tem familiares e onde moravam seus pais, que morreram em 2019.

“Os dois ficaram doentes e morreram um seguido do outro”, relata. Ele nega o uso de drogas, mas assume o alcoolismo.

Mesmo assim, se recusa a aceitar a internação oferecida, na quarta-feira, 11 de março, pelos profissionais da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social de Serra Negra.

“Não preciso de internação, não sou doente”, justifica. Açougueiro, André diz que está desempregado há mais de um ano e que em Amparo fazia apresentações de malabarismo nos semáforos em troca de alguma gorjeta.


O rapaz amparense é um dos cerca de dez moradores de rua que foram alvo de discussão de serranos nas redes sociais nos últimos dias.

Até uns meses atrás, o grupo vivia praticamente entre uma área da rodoviária, próxima ao banheiro público, e um canteiro da Praça Sesquicentenário.

Os moradores decidiram trocar o ponto e permanecem o dia praticamente todo na Avenida Laudo Natel, ao lado do banheiro público, de onde, eles avisam, não pretendem sair.

“Vamos ficar por aqui, porque a rodoviária é ponto de drogas e nós não somos nem traficantes nem usuários”, diz um deles  que prefere não revelar seu nome.

Paranaense de 54 anos, ele diz que mora em Serra Negra há 44 anos. “Sou pedreiro, tenho até bisneta, mas me perdi na cachaça”, afirma.

Ao contrário de André, ele diz que aceita a internação e está se acertando com o pessoal da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social para ser internado.

A presença dos moradores de rua não incomoda a maior parte dos serranos, segundo comentários publicados na página de um grupo no Facebook, em resposta a um desabafo de um dos integrantes.



No desabafo, o morador serrano se dizia incomodado e preocupado com o aumento da presença dos moradores de rua em uma das avenidas com maior circulação de moradores e turistas.

“Sabemos que todas as cidades tem problemas sociais. Este é o nosso, que as autoridades têm que resolver, pois se trata da porta de entrada da cidade, Avenida Laudo Natel, isto foi visto durante todo carnaval e de lá para cá só aumentou, em breve vai ficar fora de controle”, escreveu num post que já foi apagado pelo autor.

Boa parte dos comentários discordava do desabafo, atribuía a responsabilidade do acolhimento à administração municipal, mas reconhecia que esse é um problema social. Uma minoria dos comentários era de pessoas incomodadas com a presença dos moradores de rua.

“...em São Paulo começou assim e hoje ninguém mais tem força para tirar e foi assim que começou a Cracolândia”, dizia um comentário. “Essas pessoas têm famílias, fazem vergonhice (sic) na rua da feira, fazem cocô até sexo fazem ali na rua da feira!!! Passar a mão na cabeça deles é fácil quero ver ir limpar coco xixi deles!!! Eles são mal criados dormem nas portas das lojas”, dizia um outro comentário.

Dona da banca de revista localizada ao lado do banheiro púbico da Laudo Natel, Irene da Cunha tem uma convivência pacífica com os moradores de rua. “Não faço questão que fiquem por aqui. Só me incomoda às vezes a fumaça do cigarro porque tenho asma”, explica

Quem se incomoda mais, ela aponta, são os turistas, que estacionam os carros na avenida. “Eles procuram desviar, mostram descontentamento e alguns têm medo, principalmente as crianças”, relata.

Mas os moradores, Irene avalia, são tranquilos, e só às vezes brigam entre eles. “Muitas vezes apartei brigas e de vez em quando dou bronca neles”, afirma.

Irene notou o aumento do número de moradores de rua por ali, nos últimos meses. Há uma mulher jovem e também gente que veio de longe.

Os moradores de rua confirmam que nos últimos meses apareceram alguns de fora. “Tem um até de Mato Grosso”, diz um deles.

Eles dizem não ter reclamação nem de serranos nem de turistas. Ao contrário, dizem que algumas pessoas de vez em quando deixam roupas e comida, assim como alguns restaurantes e lanchonetes doam às vezes refeições.

Na quarta-feira, 11 de fevereiro, o pessoal da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social passou pelo local pelo menos duas vezes para fazer abordagens e saber qual é a necessidade de cada um.

Segundo os moradores, a secretaria oferece passagem de volta para a cidade de origem, internação para tratamento e ainda procura as suas famílias.


"Nada é à força, os profissionais da assistência social vão até lá para saber a necessidade de cada um”, diz o secretário, Danilo Guerreiro.

Entre eles há uma jovem cuja família a secretaria já está procurando, para saber como ajudar. “Não há abordagem para expulsá-los de lá”, frisa o secretário.

O problema em Serra Negra é semelhante ao de grandes cidades que têm registrado nos últimos anos aumento de moradores de rua e estão buscando soluções solidárias.

Nova York, por exemplo, anunciou no fim do ano passado que até 2024 vai oferecer abrigo a todos os que vivem na rua, com camas temporárias e moradias permanentes.

Cerca de 60 mil pessoas, entre as quais mais de 20 mil crianças, ficam diariamente em um dos abrigos da maior cidade dos Estados Unidos, 10 mil a mais do que em 2013.

A Finlândia, um país com pouco mais de 5 milhões de habitantes, reduziu em 35% o número de moradores de rua, entre 2008 e 2015, oferecendo um teto para cada um deles. Eles pagam o aluguel com parte da assistência financeira que recebem do Estado por sua condição de desemprego.

Segundo autoridades finlandesas, o maior benefício dessa iniciativa é o sentimento de pertencimento que um teto dá aos moradores de rua.



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